Os comentadores universais
Nunca os nossos meios de comunicação, sejam escritos, em áudio e sobretudo em áudio-visual, tiveram tantos comentadores. Pululam comentadores. Há-os para tudo, uns mais especializados em determinados temas, de que se destacam os comentadores políticos e económicos, esses são às dezenas, mas há os do crime, os da guerra, os do clima e claro está os do futebol. E depois há uns quantos que comentam tudo, sabem de tudo, eu chamo-lhes os comentadores universais. Divirto-me bastante com alguns, aqueles que dão notas aos políticos depois de verem os debates eleitorais. Salto de canal em canal e percebo que mesmo comentadores jornalistas ditos independentes não conseguem esconder preferências e interesses pessoais que os fazem cair por vezes no ridículo.
O comentário está na moda, e quando é feito por peritos especializados pode ser útil a cidadãos como eu, ajudando-nos a formar a nossa própria opinião. Fico estupefacto com a sabedoria de alguns especialistas militares, que sabem os nomes e os apelidos dos mísseis, as marcas e as características dos tanques e dos drones, e muitas outras coisas extraordinárias, tal como fico surpreendido como alguns especialistas de coisa nenhuma se arrogam a classificar-se como comentadores, elogiando sempre a seriedade informativa do canal que lhes paga.
Passei mais de uma década a dar a minha opinião esverdeada em programas de debate futebolístico, pretendendo defender o meu Sporting, mas nunca me intitulei comentador, era apenas um opinador muito parcial. Um comentador, para ter pretensões de o ser, em determinado assunto, tem de ser um especialista nessa área, ou pelo menos ter um conhecimento profundo dos temas em questão. Quando em 1992, o homem da estratégia da campanha eleitoral de Bill Clinton lhe deu o mote ganhador, com a frase assassina que se tornou viral, “ É a economia, idiota!” focando na campanha o tema ganhador, e deixando para segundo plano a guerra do golfo, provou como pode ser útil e decisivo um competente analista comentador. Nem todos os que se lembram desta frase se lembram do nome de quem a inventou e a lançou naquele contexto, eu próprio tive de ir ao Google para me lembrar de James Carville. Mas a razão desta visita ao passado prende-se com a maneira como queria encerrar esta crónica, num dia, forçosamente asséptico de reflexão eleitoral.
Não temos nos vários canais televisivos nenhum comentador na área de saúde, mas já alguns, dos ditos universais se permitiram comentar partes do chamado plano de emergência para a saúde apresentado há dias. Elogiando a parte do programa que permite o recurso aos privados para combater os atrasos nas cirurgias oncológicas. Não sei bem o que é uma cirurgia oncológica, presumo que nos referimos aquelas cirurgias, que incluídas numa estratégia global de tratamento, definida por uma vasta equipa multidisciplinar, deve ser feita numa determinada altura, por uma equipa de cirurgiões que participou nessa decisão, e com determinadas regras. A ser assim, digo apenas a todos aqueles que pensem ser essa a solução, um pouco à maneira de James Carville, É a competência que está em causa, idiotas!!!!
PS - It´s the economy, stupid, não pretendia insultar ninguém, aqui a tradução correta até é mais idiota que estúpido. Pretendia apenas atrair para a economia o tema central da campanha, como que a dizer que mais nada interessava discutir. Não era chamar estúpido ou idiota a ninguém, era antes dar um abanão a todos os que por falta de visão ou apenas distraídos não traziam o tema da economia para o cento do debate. Um comentador que elogia determinada medida deve fazê-lo porque conhece o tema em debate, reflectiu sobre ele, e dá o seu aval. Não pela origem dessa medida, e muito menos apenas porque ela parece óbvia. É que às vezes o que parece, vendo bem não é, mas nem sempre o rei vai nu.