Uma história de erros por trás das muitas crises da Europa
Pela primeira vez na minha vida há uma hipótese de a integração europeia poder dar um passo atrás. Não posso prever se haverá novos ataques terroristas, se os britânicos vão sair da UE, qual o número de refugiados que virá neste ano ou no próximo, ou se a crise da zona euro vai regressar. Mas tenho a certeza de que a probabilidade de pelo menos uma dessas crises sair fora de controlo é realmente muito alta.
Em retrospetiva, a UE deu um passo em falso ao instituir uma moeda única sem uma união bancária adequada. Foi errado criar um espaço de livre circulação de pessoas sem uma força policial de fronteiras comum e uma política de imigração. Gostaria de acrescentar o alargamento da UE a esta lista, não o princípio em si, mas a pressa com que ele foi executado.
O erro fundamental do nosso tempo foi a maneira como foi gerida a crise da zona euro. A liderança política da Europa não conseguiu gerar o apoio público para o que era necessário: a criação de uma união política e económica. Em vez disso, o Conselho Europeu fez o mínimo necessário para o sistema sobreviver até ao dia seguinte.
São quatro os aspetos em que essa política contribuiu para a maior instabilidade da UE atual.
O primeiro, e mais óbvio, é que a UE tem a capacidade de lidar apenas com uma grande crise de cada vez. A UE não é um governo. A Comissão é em parte executiva, em parte administrativa e em parte guardiã dos tratados europeus. O Conselho Europeu não é um governo tradicional, mas um grupo de líderes nacionais que se reúnem algumas vezes por ano para tomar decisões. Eu nunca apostaria contra a possibilidade de o Conselho Europeu chegar a compromissos mínimos, mas apostaria sempre contra a sua capacidade de resolver problemas do mundo real. A resolução de crises eficaz requer o poder executivo, algo que a UE não tem.
O segundo aspeto é a combinação, real ou imaginária, de mais duas crises. A economia grega continua em contração e os refugiados ficaram presos na Grécia, cada vez em maior número, desde que a Macedónia fechou as fronteiras. Este é um exemplo de duas verdadeiras crises que aparecem em simultâneo.
Mas depois há as ligações falsas. A Polónia usou os atentados de Bruxelas da semana passada como pretexto para questionar um compromisso de aceitar 7000 refugiados no âmbito de um sistema de quotas previamente acordado. Outro exemplo é uma interação entre os ataques terroristas e a perspetiva da saída britânica da UE. Não há qualquer relação factual entre as duas coisas, mas isso não impediu que alguns ativistas do brexit usassem os ataques para os seus próprios objetivos políticos.
O terceiro aspeto é económico. O rendimento de vários países da zona euro ainda não voltou aos níveis pré-crise. A segurança, tanto interna como externa, está entre as áreas mais afetadas pela austeridade. Muitos governos acharam mais fácil cortar os gastos com a polícia e as forças armadas do que nos programas sociais.
Outro fator económico que tem dificultado os esforços de resolução das crises da Europa é a cada vez maior diferença de rendimento entre ricos e pobres - e entre o Norte e o Sul. Isso reduziu a disposição dos Estados ricos do Norte para aceitarem transferências orçamentais, pois estas seriam grandes e permanentes.
O quarto aspeto é o mais importante: a perda generalizada de confiança e de capital político. Com cada crise por resolver, o grau de euroceticismo na população aumenta. Se a UE for vista como incapaz para resolver os problemas, as pessoas tornam-se naturalmente mais relutantes em conceder novos poderes à instituição. Os partidos populistas, à esquerda e à direita, estão a explorar as falhas da união. Eu não ficaria surpreendido ao ver um desses partidos ganhar umas eleições num grande país europeu um dia destes.
A combinação destes quatro aspetos frustra ideias realmente boas para novos projetos destinados à integração europeia - aqueles que beneficiariam toda a gente, como agências centrais para coordenar a luta contra o terrorismo e lidar com o afluxo de refugiados. Se a UE não tivesse feito asneira nas crises anteriores, as pessoas iriam olhar para uma política europeia de imigração ou uma força de intervenção antiterrorismo com um espírito mais aberto.
Mas quem é que confiaria a sua própria segurança a alguém que não consegue sequer conter uma crise financeira de média dimensão? Eu, pessoalmente, não o faria, razão pela qual a minha preferência vai para a suspensão por tempo indeterminado do espaço Schengen de livre circulação ou, pelo menos, até que a soberania sobre as fronteiras, a imigração e a luta contra o terrorismo passe totalmente para o nível da UE - algo que eu não estou à espera de que aconteça.
A história económica tem demonstrado, uma e outra vez, que os esforços para gerir desta forma as crises financeiras nunca resultaram - basta pensar na Grande Depressão ou nas décadas perdidas do Japão. Para a UE foi um erro político catastrófico. Não só nos deixou numa depressão económica, da qual muitos países ainda não recuperaram, como também destruiu a confiança do público na UE e na própria ideia da integração europeia.