Vamos falar de responsabilidades...

...DA CRISE BANCÁRIA. É, antes de tudo e de todos, dos banqueiros. As imparidades. As falsidades. As leviandades. As inverdades. As mediocridades. A alta finança encolheu e os banqueiros perderam estatura. E estatuto. Pobres coitados, precisam de ajuda, que o Estado os proteja e que a gente os salve. Pobres de nós, da gente que somos todos, porque o risco é sistémico e o sistema não pode faltar a ninguém. Resolução, recapitalização, muito milhão, tanto e tantos que se cortam os zeros para se aumentar a unidade.

A conta aumenta de bilião em bilião. Para públicos e privados, sem ideologia, porque esta coisa da esquerda e da direita nada tem a ver com a vergonha que falta na cara. E o dinheiro que desapareceu dos bancos. "O diabo que os impariu", o trabalho que valeu a Pedro Guerreiro e Isabel Vicente o prémio de jornalismo económico do ano. Ironicamente atribuído pelo Santander Totta.

Não foi só uma questão de crédito malparado. Havia sobretudo uma história mal contada. Por isso aqueles dois atiraram-se à odisseia da segunda destruição massiva de valor da nossa História recente: a primeira foi com a decapitação empresarial de 1974; a última foi provocada por este capitalismo de algibeira que temos. De algibeira furada e capitalistas de papo-furado.

O assunto é grave e até pode desencadear uma turbulência na economia global - vejam bem!, diz o FMI. O xerife perdeu a estrela e ficou alarmista. Até a nossa banca já adquire o estatuto de "perigo para a humanidade". A pergunta essencial não está, porém, respondida: Como foi possível?! Quem permitiu que aqui chegássemos? A esta escala e com tamanha profundidade?!!!

Artur Santos Silva veio dizer que foi a gestão. Ele que, entre os pares, foi e ainda é um dos mais proeminentes e duradouros. Como o seu siamês Ulrich. Ou outros que fizeram a história, como João Salgueiro, Rui Vilar, Jardim Gonçalves, Filipe Pinhal, Faria de Oliveira, Vasco Mello ou João Costa Pinto. E o prodigioso Horta Osório. Ou até o saudoso Silva Lopes, um homem digno, seriedade à prova de bala.

Eram todos patifes ou patetas? Quem tinha tino não tinha escrúpulos? Desleixo coletivo que ninguém viu? Ou desmando que ninguém o travou? Os riscos não eram calculados e os créditos bem avaliados? Imparidades generalizadas? E o que pensar de todos aqueles que os nomeavam e, vezes sucessivas, continuavam a reconduzi-los e neles confiar? Como, em muitos casos, ainda continuam.

Alexandre Soares dos Santos, João Pereira Coutinho, os Mello e os Espírito Santo, Francisco Balsemão, que confiou no João, e Champalimaud que não confiou em ninguém. Mais a milionária Maude e o irmão. Os ricos portugueses gostavam tanto de bancos que meteram muito dinheiro neles. Famílias do Norte e latifundiários do Sul. Muitas ações, pouco ativos, incluindo os sócios que eram alemães e catalães, angolanos e franceses, ou os fundos e todos os que se dizem institucionais. E mais. E mais...

Para a História fica esta história - que em nada abona a favor da elite financeira-industrial que as portas de Abril abriu. Para a frente, pode rebentar sim uma crise por causa desta bomba-relógio chamada "banca portuguesa". Não serão os primeiros bancos a rebentar - já lá vão cinco, que em seis anos custaram ao Estado 13 biliões de euros, mais do que o Estado cortou nos quatro anos de austeridade. Mas se houver próximos poderão ser quem vai rebentar connosco.

Haverá novo resgate a Portugal. Mas não se chamará assim, nem servirá apenas a Portugal. Terá de acontecer, é inevitável algo batizado de "revitalização da banca europeia" - que os italianos necessitam, os portugueses agradecem e os alemães aproveitarão para limpar o lixo que se vai descobrindo debaixo do gigantesco tapete do Deutsche Bank.

...DA CHAFURDICE POLÍTICA. Só mentem quando é preciso. Mas torturam a verdade sempre que lhes convém. Falam em nome da Nação que os escolheu e não os conhece. Mas apenas tratam da vidinha. Da sua, que algo ou a alguém raramente serviu. Por isso se fazem à lista e ao lugar elegível. Dependem disso e das televisões que lhes dão visibilidade. Na maioria dos casos confunde-se com existência. Dobram a espinha para entrar em palco.

Não são todos assim, mas a todos serve a dúvida: onde estavam no dia em que morreu o BPN? E o BES? E o Banif? A fazer perguntas, muitas perguntas, dizem, no plenário, nas comissões, aos ministros - seguramente perguntas terríveis, de preferência a ministros que não são "dos nossos".

Les uns, les autres. Contentaram-se com as perguntas que fizeram e com as respostas que receberam, e enquanto estavam todos contentinhos, banco a banco, o sistema financeiro estava a transformar-se num enorme queijo suíço. Sim, a crise bancária também é um reflexo da crise política. Porque os políticos partidarizam-na, porque os partidos ocultam a realidade quando estão no Governo e sacodem responsabilidades quando passam à oposição.

Sem ambiguidades, nem meias palavras, as três tragédias recentes têm três responsáveis bem identificados: o PSD (que tem a responsabilidade ativa); a sua ministra das Finanças (que personifica a arrogância ignorante, ou a ignorância arrogante, tanto faz...); e o CDS (em cumplicidade silenciosa, porque antes coligado do que morto).

Culpar a geringonça por um buraco de três mil milhões no Banif, por outro tanto na CGD e pelo imbróglio do Novo Banco é ofender a inteligência dos portugueses. Pior: justificar este terramoto na banca nacional com os últimos seis meses é impedir que um dia se esclareça o que quer que seja. Não houve um terramoto financeiro em Portugal, simplesmente o sistema está a ruir por dentro.

Costa, Centeno e companhia são responsáveis por muita coisa, podiam por exemplo carregar baldes de água em vez de depósitos de gasolina. Mas não são eles que devem responder pelo fogo que encontraram na tomada de posse. Por isso, não é admissível o papel que Passos Coelho anda a fazer - porque contrasta com a seriedade dos anos em que aplicou a inevitável austeridade. E não é decente a figura de alguns dos seus mentecaptos no Parlamento.

A sociedade não permite este tipo de comportamentos. E por isso tem vindo a desacreditá-los e a infligir derrotas humilhantes aos partidos do sistema, um pouco por todas as democracias ocidentais. Seria higiénico, não fosse a troca destes idiotas convencionais estar a ser feita por populistas, nacionalistas e radicais.

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