Estado de emergência. Primeiro desejado e depois…odiado?

Os portugueses terão dificuldade em lidar com algumas das regras desse decreto e as empresas pior ainda.
Publicado a
Atualizado a

A pandemia já matou mais de 7 mil pessoas no mundo e infetou mais de 180 mil. Portugal regista 448 casos, ou seja, foram mais 35% terça-feira face ao dia anterior, somando 117 casos novos. Um aumento igual ao dos últimos dois dias. Portanto, a boa notícia é que não disparou descontroladamente o contágio, cenário temido pelos médicos.

Nunca esta população ativa, onde eu me incluo, pensou enfrentar tamanha calamidade. Lá fora, sem falar na "bazuca" anunciada pela Alemanha e abordando só os vizinhos mais próximos, temos notícias ajudas à economia de 200 mil milhões de euros em Espanha e 300 mil milhões de euros em França. Por cá, o governo passou de 100 milhões para 200 milhões a linha de crédito para as empresas, além de apoios para empresas e trabalhadores no que toca a algumas obrigações fiscais e de segurança social. Só esta quarta-feira é que serão anunciadas mais medidas. Empresários, trabalhadores, famílias pedem mais apoios ao governo. E são precisos. No Dinheiro Vivo temos dado conta dos sectores e das empresas, caso a caso, que temem pela falência face ao impacto do coronavírus. As moratórias são talvez um dos pedidos que mais eco fazem nas varandas, produzindo quase tanto barulho quanto as palmas que às 22 horas (em alguns bairros diariamente) homenagearam e continuam a homenagear os profissionais de saúde. Pedem-se moratórias para o pagamento das dívidas, dos impostos, da segurança social, do crédito à habitação. E, meus caros governantes e banqueiros, está na hora de mostrar quão solidários estão com os vossos eleitores e clientes.

É que esta crise não vai passar de fininho. Vai demorar e ter efeitos perversos no tecido empresarial e nas redes familiares. Vários economistas começam a dizer (baixinho) que pode vir aí uma crise mais profunda do que aquela que vivemos em 2008. Pior, alguns admitem que poderá vir a ser incontornável um novo resgate financeiro, se o estrondo for tão grande quanto anteveem os mais pessimistas que, por vezes, são simplesmente os realistas e que ninguém quer ouvir. Eu própria, não me revejo nos "velhos do Restelo", mas sou sensível à enorme dor de quem trabalha e de quem empreende.

Depois de tudo isto passar, pode vir aí um aumento de impostos, de novo? Pode, mas com isso já nós lidámos antes, após a chegada da Troika. Agora, lidar com a morte dos nossos mais queridos - pais e avós - é que não. Não estamos, nem estaremos preparados. Que a idade os leve um dia é uma coisa, mas que um vírus os mate porque o sistema nacional de saúde, para o qual tanto descontamos, não tenha capacidade de os salvar é outra coisa bem distinta. E aí não vai haver suspensão de direitos, liberdades ou garantias que impeça os portugueses de se manifestarem nas ruas. Os portugueses não se calarão. E as consequências políticas serão inevitáveis para os vários órgãos de soberania. Por falar em direitos, liberdades e garantias, estamos todos expectantes para saber se o Estado de Emergência será ou não declarado esta quarta-feira. Se o for, vai suspender todos esses direitos constitucionais temporariamente. A opinião pública está dividida, mas muita afirma com convicção que o decreto "já vem tarde". O Estado de Emergência poderia ser desnecessário, se o governo tivesse controlado as fronteiras mais cedo e se todos acatassem as recomendações da Organização Mundial de Saúde e da Direção Geral de Saúde. Mas como muitos portugueses preferiram ir para a praia, já com todos os alertas na rua, e não prescindiram de fazer as suas viagens de férias para o exterior, agora é também por causa de muitos desses que poderemos ter de suspender os tais direitos, liberdades e garantias. A questão agora é saber se o tão desejado Estado de Emergência não vai ser... odiado. Os portugueses terão dificuldade em lidar com algumas das regras desse decreto e as empresas pior ainda. Muitos empresários receiam que o Estado de Emergência bloqueie ainda mais a economia. Aliás, falam num "total apagão" que pode levar anos a recuperar, no caso das empresas que ainda consigam levantar-se depois desta pandemia. As consequências desta arma, nunca usada em democracia, terão de ser muito bem ponderadas. Bem sei que faltam poucas horas. Mas, na ânsia de calar a opinião pública, vai ser necessário respirar e ter a capacidade de olhar a floresta em vez de apenas a árvore. É uma decisão difícil? É. Não queria estar na pele do primeiro-ministro, nem do presidente. Mas deixo aqui um apelo: que a decisão coloque de lado as cores políticas e os futuros atos eleitorais e que, por um momento, se decida em prol do que é melhor para a nação. Mas sejamos claros: faça o que fizer o presidente e o primeiro-ministro, o poder de conter o vírus está, em boa parte, nas mãos do povo. Quem está agora em casa, protegendo as suas famílias e trabalhadores ainda que prejudicando os seus negócios, tem de continuar a pressionar no sentido de tudo se fazer para conter a pandemia, mesmo que o Estado de Emergência venha, temporariamente e por decreto, a limitar os seus direitos de circulação. A luta contra o Covid 19 continua.

#Eu fico em casa, em teletrabalho.

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt