Feminista e antimonopolista, duas boas máscaras para este entrudo

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A Lurdes, uma lourinha sardenta de olhos azuis, minha colega na primária, não usava saias nem vestidos e mascarava-se de cowboy ou Zorro. Ficou-me na memória por ser uma exceção. Nos carnavais da minha infância, anos 1980 em todo o seu esplendor, os rapazes eram John Waynes, de chapéu e arma de brincar à cintura, ou heróis de capa, mascarilha e espada. Entre as raparigas, destacavam-se as damas antigas.

Uma dama antiga é hoje um conceito tão anacrónico como um telefone com fios e os cowboys só sobrevivem graças ao Woody de Toy Story. Mas terão as coisas mudado assim tanto?

A minha experiência como mãe diz-me que não. Existem Lurdes, claro (sou mãe de uma), mas as miúdas continuam a querer mascarar-se de princesas (tenho duas assim) enquanto os rapazes desejam ser heróis - transformer, storm­trooper, ninja. É também o que me diz uma consulta por WhatsApp aos pais de amigos das minhas filhas e é o que me devolvem os resultados nas lojas da especialidade onde se podem encontrar disfarces "para menina" ilustrados com uma Ana do Frozen e "para menino" ilustrados com um Homem-Aranha.

As opções são semelhantes para ambos os géneros, mas as raparigas têm à sua disposição a polícia de saia, a cowgirl de saia ou a guarda inglesa de saia. Três atividades que, em bom rigor, dispensam o desconforto da saia, mas não vamos deixar a imaginação travar-nos. Ou vamos? É que parece que nem no Carnaval conseguimos largar os preconceitos.

A outra constatação é que já não há Carnaval sem Disney, como se pode apreciar nos parágrafos anteriores em que pelo menos três vezes foram citadas personagens que a marca explora (verbo usado com intenção). As princesas não se limitam a ser princesas. São louras de vestido rosa como Rapunzel, de vestido amarelo como Bela ou de vestido azul e cabelo branco em trança como Elsa.

A boa notícia é que há uma flor a nascer no pântano. Escondida sob a capa de uma adolescente como tantas outras vive Ladybug, uma heroína de fato de licra que não pede licença ao protagonista masculino, Cat Noir, para salvar Paris dos supervilões - e é um êxito de Carnaval. Passa no teste do feminismo e no das práticas antimonopólio também. Criada pelo francês Thomas Astruc para a Zagtoon, a única ligação à Disney é ser transmitida no seu canal. Há esperança!

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