Preparem-se para um Brexit com o selo de Boris, seja lá o que isso for

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Bem pode a The Economist assumir que teme um Partido Conservador a coroar Boris Johnson ou o Le Monde publicar um editorial sobre a tragédia de ter o antigo jornalista do Telegraph como primeiro-ministro britânico. A verdade é que cada vez mais parece ser este o homem do momento no Reino Unido, depois de garantir o apoio de metade dos deputados conservadores e partir agora em vantagem clara nas sondagens para o duelo final com Jeremy Hunt - duelo que será decidido pelos 160 mil militantes do partido através de voto postal.

Hunt, que conseguiu ultrapassar com certa surpresa Michael Gove para estar na ronda definitiva, tem agora uns dias para inverter o favoritismo do homem que o antecedeu como ministro dos Negócios Estrangeiros, e o seu principal argumento é mesmo o estilo imprevisível e até contraditório de Johnson. Com mais experiência governativa, Hunt seria uma escolha para líder conservador dentro de parâmetros mais habituais.

Os tempos não são, porém, os habituais. Não só gerir a saída da União Europeia é um desafio gigantesco, como as sondagens mostram a dificuldade dos conservadores em ganhar as legislativas num quadro em que o Partido do Brexit e os liberais teriam votações de 20% ou mais e os trabalhistas, mesmo caindo, conquistariam o governo. Assim, o carisma de Johnson dá-lhe força, até porque já mostrou ser bom a atrair votos, basta pensar como foi eleito mayor de Londres e como ajudou ao triunfo do Brexit no referendo de 2016.

Johnson tem também a distingui-lo de Hunt o ter sido o tal campeão do Brexit, enquanto o rival defendeu a permanência na União Europeia. Será mais natural, pois, ser o brexiteer a gerir o processo. Basta ver como Theresa May, também defensora do remain no referendo, nunca teve sucesso a fazer a ponte entre o partido e Bruxelas.

Porém, Hunt surge como um pouco mais difícil de derrotar para Johnson do que Gove exatamente porque pode dizer mesmo que é diferente, que é uma alternativa. Não deve chegar, mas traz um mínimo de incerteza a esta corrida.

Se tudo correr dentro da normalidade, e como já foi realçado, só o ar dos tempos não garante isso em absoluto, Johnson será líder do partido e primeiro-ministro após 22 de julho. As próximas eleições serão só em 2022, a não ser que o governo falhe uma moção de confiança por deserção dos aliados unionistas ou traição de alguns conservadores, o que não é provável dado que a renovação dos assentos seria difícil, em especial para os últimos. Outra hipótese é dois terços dos deputados votarem para antecipar eleições, desejo dos trabalhistas de Jeremy Corbyn, mas cenário ainda mais improvável pois os conservadores nada têm a ganhar com serem testados.

Os 27 vão, pois, ter de lidar ou com um Johnson decidido a concretizar o Brexit até 31 de outubro der por onde der ou um Hunt que não exclui a saída dura mas que é mais diplomata. Percebe-se o pensamento da The Economist e do Le Monde, mas como se viu há três anos não serão os editoriais dos media sérios a travar a atração de muitos britânicos pelo populismo do antigo correspondente em Bruxelas. A hora é de Boris.

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