A derrota do filho do papá, do netinho da avó e do bisneto prodígio
Há duas formas de olhar para o resultado das eleições indianas: ver Narendra Modi como o grande vencedor ou ver Rahul Gandhi como o grande derrotado. E sem tirar mérito ao atual primeiro-ministro, cuja fama de bom gestor vem dos tempos de ministro-chefe do Gujarate, é cada vez mais óbvio que a força de um apelido, a pertença a uma dinastia, já não chega para alguém triunfar na Índia. Isto mesmo que o candidato se chame Rahul Gandhi e seja filho de Rajiv Gandhi, neto de Indira Gandhi e bisneto de Jawaharlal Nehru, o primeiro-ministro que proclamou a independência em 1947, grande amigo do Mahatma Gandhi.
Modi, líder do BJP, já em 2014 esmagara nas urnas Rahul, então demasiado à sombra de Sonia, a viúva italiana de Rajiv. O desempenho económico do seu governo foi bom, mas não foi excelente. Em paralelo, nestes cinco anos, apesar de alguns excessos de políticos e militantes nacionalistas hindus, a democracia indiana manteve-se sólida e a pluralidade religiosa e linguística continua a marcar a sociedade indiana, o que abona a favor de Modi.
Contudo, é difícil não ver méritos na família Nehru-Gandhi (este segundo apelido vem do marido de Indira e não tem relação com o Mahatma), que lutou pelo fim da colonização britânica, liderou durante décadas o novo país independente e viu ainda dois dos seus serem assassinados por motivos políticos. E se Nehru era um hindu de casta alta, um brâmane, a filha casou com um parsi e o neto com uma católica, o que tornou a dinastia um símbolo da diversidade que é marca do país.
Mas o partido do Congresso, com uma história de combate pela Índia, está hoje demasiado refém dos Nehru-Gandhi. Mesmo quando governou na última vez, com Manmohan Singh como primeiro-ministro, toda a gente sabia que era Sonia quem mandava nos bastidores. E perante a pujança do BJP, pró-mercado além de nacionalista hindu, um Congresso competitivo, integrador e mais atento às questões sociais, seria o melhor que poderia acontecer à democracia indiana, a tal que é a maior do mundo.
Receio, porém, que os militantes do Congresso prefiram ser reféns dos Nehru-Gandhi do que órfãos deles. E que comecem já a olhar para Priyanka, a irmã de Rahul, como a fórmula para derrotar Modi, o filho do vendedor de chá que é um fenómeno.