Homenagem à Extremadura
É sempre às 11 da noite que começam as peças do Festival de Teatro Clássico de Mérida. Por um lado, o calor do verão fica mais suportável, por outro, a beleza das ruínas romanas da antiga capital da Lusitânia ganha com o jogo de luzes magia extra. Para mim, assistir, como neste fim de semana, a atores a citar as palavras de Ovídio, autor latino de há dois mil anos, é a melhor experiência que tenho da Extremadura, esta região espanhola vizinha do Alentejo e das Beiras.
E o teatro romano de Mérida, também visitável fora da época do festival, não triunfa por falta de competição: que o diga quem já visitou o centro histórico de Cáceres, o mosteiro de Guadalupe onde nos surpreende um El Greco e um candeeiro turco de um dos barcos da Batalha de Lepanto, essa Zafra que é uma pequena Sevilha ou o parque natural de Monfrague, para os mais aficionados à natureza. Relembremos-nos de que a Extremadura pode ter só um milhão de habitantes, mas é tão grande como metade de Portugal. Inclui até um pedaço que já foi português, essa Olivença (ou Olivenza) recheada de estilo Manuelino.
Não falta, pois, património histórico a esta região, não só do tempo do imperador Augusto, fundador de Mérida, mas também da época em que foi berço de gente valorosa como Hernán Cortés, conquistador do México, ou Francisco Pizarro, conquistador do Peru. Cada qual tem direito a imponente estátua nas cidades onde nasceu, Medellin um, Trujillo o outro. E há ainda Vasco Nuñez de Balboa, primeiro europeu a avistar o Pacífico e filho de Jerez de los Caballeros. Em sentido contrário, o imperador Carlos V, o homem mais poderoso da Europa no século XVI, escolheu morrer num mosteiro em Yuste, não muito longe de Plasência.
Abundam em Espanha as regiões fascinantes, seja a Andaluzia, a Galiza, o País Basco, Madrid claro ou a Catalunha, onde brilha Barcelona. Um dia, enquanto combatente da Guerra Civil, George Orwell escreveu até o livro Homenagem à Catalunha. O tema do escritor britânico, famoso por 1984, era sobretudo a valentia de quem combatia, mas aproveito a sua inspiração no título para fazer aqui uma homenagem à Extremadura, das cidades mais famosa, como Mérida, às terrinhas como a Aldea Centenera onde durante umas eleições espanholas estive em reportagem.
É que a Extremadura é muito mais, mas mesmo muito mais, do que a estrada que se usa para ir de Lisboa até Madrid. Já agora, esqueça as ideias-feitas sobre atravessar a fronteira para ir comprar caramelos e comece a descoberta logo por Badajoz, com a sua Alcazaba e a sua Plaza Mayor, com esplanadas onde se come presunto e se bebe bom vinho. Sim, a Extremadura também é isso: gastronomia, ou não fosse ela ainda uma região muito agrícola (a deusa Ceres tinha lugar de honra no teatro já no tempo dos romanos).