Washington anestesiada - ou conformada
Nada de novo no Memorial de Lincoln, business as usual na Casa Branca. As cartas que espalharam engenhos explosivos por moradas selecionadas de ponta a ponta do país (acredita-se que há ainda três por incluir no lote, segundo as últimas na América) fizeram soar os alarmes no governo e no Congresso e sobretudo na imprensa. Mas a vida por cá segue igual, como se não houvesse já possibilidade de choque ou como se os americanos tivessem perdido a capacidade de se alarmarem com terrores internos.
As notícias dos mais recentes acontecimentos, a passar nas televisões dos cafés e bares, não fazem mexer nem uma cabeça.
Talvez nem uma hora depois de descoberto o pacote enviado para uma rádio em Washington, milhares de turistas, incluindo eu própria, passeavam-se placidamente nos jardins entre o Obelisco e a estátua de Lincoln. Umas quantas turmas de escolas do país também saltitavam por ali - a professora a reunir um grupo de alunas tresmalhadas: "está toda a gente à vossa espera! Peçam desculpa ao sr. Johnson quando entrarem na camioneta!"
Um par de quilómetros acima, era preciso esperar vez para conseguir uma fotografia da casa do presidente sem cabeças alheias. No percurso e na rua, fechada ao trânsito mas permitindo aos visitantes quase colar-se aos portões para espreitar os domínios presidenciais, havia não mais do que uma meia dúzia de polícias. Apenas um helicóptero a pairar causava estranheza - num olhar mais atento, entendi que pertencia a um canal de notícias local.
Percorri o centro, subi ao bairro das embaixadas, cruzei-me com centenas de pessoas, locais e de fora. As conversas seguiam ao ritmo normal, as gargalhadas seguiam descomprometidas e despreocupadas, as corridas de fim de tarde não foram adiadas, o copo para relaxar do dia de trabalho manteve-se.
No reino de Trump, já ninguém quer saber de ameaças. Estão todos à espera do Halloween (e têm esperança de poder continuar sem ter de se preocupar).