Rogério Rodrigues. Jornalista
Escrevia bem - com aquela forma tersa do Afonso Praça. Talvez fosse necessário ter nascido transmontano e andado em seminário para aí chegar. Escrevia sobre bandidos desesperados ou sobre uma doida que dançava nua na cidade. Talvez porque a normalidade também cansa. Ou talvez porque a doida se fazia chamar Torga porque havia um poeta assim. Escrevia raramente sobre amigos. Talvez porque estes mereciam mais que se bebesse com eles e lhes dedicasse lealdade sempre e fidelidade nunca. Escrevia o que talvez não viesse a escrever quando falava com o José Cardoso Pires, o Fernando Assis Pacheco ou o Dinis Machado porque tinha amor, amor mesmo, pela escrita. Falava sempre com voz rugosa porque as letras, aprendeu-o no papel, são para arranhar. Foi o Rogério Rodrigues do Diário de Lisboa, o Rogério Rodrigues de O Jornal, o Rogério Rodrigues do Público, o Rogério Rodrigues sempre envolto numa coisa junta, porque o jornalismo é uma súmula, e nesta a parcela só conta se pensa no todo, aquela sinopse que a lê.
Não vejam saudosismo no que deixo na morte do jornalista Rogério Rodrigues, um grande quando se começou a escrever com liberdade, porque o jornalismo é tão imprescindível quanto o foi quando ajudou, com jornalistas à Rogério Rodrigues, a cimentar a liberdade.
Um dia destes, um jovem ou um velho jornalista vai-me entrar por este DN e estender-me um papel ou o ecrã do telemóvel: "Tenho aqui a história sobre um garoto de Torre de Moncorvo, Trás-os-Montes, que foi mandado sozinho para o seminário de Macau e dele veio com um português, como dizer, terso... Publica-o?" Claro. Pago pouco, e fico com os olhos brilhantes.