Precariedade: Governo suspende "promessa" ao fim de três meses
Uma coisa é achar-se que este Governo é a melhor solução possível para a atual realidade do país - é o que penso. Outra é o caos pela falta de coordenação e competência em redor de António Costa. Este é mais um caso flagrante: numa medida claramente de propaganda, o Governo resolveu publicar uma Portaria, a 19 de Setembro (duas semanas antes das eleições), com a medida "Converte+". Genericamente tratava-se de apoiar as empresas, durante seis meses, a converter contratos a prazos em vínculos laborais sem termo. "Lutar contra a precariedade", era um dos motes da campanha do PS e da esquerda.
Sabe-se o quanto em Portugal os contratos a prazo são a base da excessiva precariedade. Ainda assim, fazer-se algo assim, em cima das eleições, é populismo. De qualquer forma, a ideia era boa e ficou.
Entretanto, o que sucedeu? Três meses volvidos, o site IEFP (Instituto de Emprego e Formação Profissional) anuncia desde esta semana: "Período de Candidaturas Encerrado". Isto apesar de, no Diário da República, estar escrito que "a presente Portaria vigora até 31 de Março de 2020".
Mergulhando-se neste assunto encontra-se a vida real. O IEFP criou regulamentação própria onde limitava as candidaturas ao "Converte+" até 6 de Janeiro. Pergunta-se: porquê 6 de Janeiro? Uma de duas conclusões: ou o Governo acha que a luta contra a precariedade é para "inglês ver" e as eleições já passaram; ou alguém tem de pôr ordem na interpretação livre da lei feita pelo IEFP
Pode haver ainda outra explicação: o Ministério das Finanças achou que a medida foi demasiado bem-sucedida e deu ordem ao IEFP para fechar a torneira.
Em qualquer caso supõe-se que alterar, casuisticamente, o prazo da medida, é ilegal. A portaria não está condicionada a "plafonds" ou "a quem se inscrever primeiro". Foi regulamentada para vigorar até 31 de Março. Presumia-se que o Governo gostaria de estimular o maior número possível de conversões de contratos a prazo em vínculos definitivos. Qual será a justificação para tudo isto?
Seja como for, há um reino de "faz de conta" que não é bom. Aparecem impulsos para solucionar problemas, mas depois alguém se esquece de algo. Ou então aparece Centeno a dizer que não há dinheiro e toda a gente fica zangada. Ou até há dinheiro, mas um certo "porreirismo" na máquina do Estado transforma o dia-a-dia com os cidadãos e empresas numa balbúrdia. (Breve nota: mão amiga fez-me chegar esta semana uma carta da Segurança Social que notificava, com três meses de atraso, uma decisão tomada em Setembro. Foi enviada para uma morada onde já não estou há 15 anos!)
Este caos tem um preço, sobretudo para as empresas, que nunca sabem com o que podem contar. Sim, os empresários gostam do PS quando há dinheiro e sim, votam PS quando não há melhor alternativa. Mas não conseguem ser do PS - nem eles nem os quadros superiores da economia privada conseguem lidar com este Estado sem fibra gerido pelo PS. Por essa razão os socialistas não conseguem recrutar bons ministros nesta área.
Em consequência, os socialistas são demasiado centralistas e excessivamente dependente das grandes corporações que influenciam as decisões; ou dos gabinetes de advocacia; ou das grandes consultoras. Percebe-se que as decisões de fundo têm por base muita macroeconomia e pouco de economia real. E quando têm, acontece isto...
Por isso mesmo António Costa tem de encontrar tenacidade para tornar a máquina do Estado competente. E alargar o número de pessoas que lhe traduzam o mundo real da economia portuguesa para além de Centeno, Siza Vieira ou Jorge Coelho.
Se não agir em casos como o do "Converte+" e outros tantos, dá uma imagem de atuação casuística e oportunística, que não consolida confiança em si e no seu Governo. Os cidadãos mais tarde ou mais cedo perguntar-se-ão: quem manda afinal no país? E traduzem isso em sondagens (e depois em votos) que tornam a tarefa de um Governo minoritário literalmente impossível.