"Serão os europeus a escolher o seu futuro"
Foi assinado há 60 anos, em Roma, o Tratado da Comunidade Económica Europeia. A União Europeia era, nessa altura, muito diferente do que é hoje: uma CEE que contava com seis Estados membros. Na primeira reunião do Conselho estavam à volta da mesa seis ministros. Se estes seis ministros estivessem ainda hoje entre nós, ficariam com certeza impressionados com o resultado daquela primeira reunião. Em seis décadas, a CEE de seis países transformou-se numa União Europeia de 28 Estados membros, que uniu a Europa após queda da cortina de ferro, estabeleceu um mercado interno com uma moeda única, e constitui um projeto único de paz e de prosperidade. A Europa é, hoje, um lugar muito melhor do que era há 60 anos, porque foi capaz de adaptar-se aos novos desafios e novas realidades. Adaptou-se quando passou a eleger os deputados europeus por sufrágio direto e universal; adaptou-se com a reunificação da Alemanha e o alargamento a treze novos Estados membros, a maior parte dos quais do antigo bloco de Leste; adaptou-se quando aprovou o Tratado de Lisboa para ajustar as instituições ao tempo em que vivemos.
Hoje, a Europa tem de olhar bem para si própria e saber adaptar-se outra vez.
Desde logo, porque a dimensão dos desafios com que nos confrontamos não tem precedentes. Penso na crise económica e financeira pela qual passámos, e da qual ainda não recuperámos inteiramente; no afluxo de refugiados como nunca vimos, resultante de conflitos que têm lugar na nossa vizinhança; nos ataques terroristas que nos fazem temer pelo bem-estar das nossas famílias e pela estabilidade das nossas sociedades. Não tenhamos ilusões: estes fenómenos não conhecem fronteiras e são demasiado vastos e complexos para serem resolvidos por países individuais. Os desafios da Europa são desafios globais.
O mundo está a mudar, e com ele a posição da Europa no mundo, o que também exige uma adaptação para o futuro. É previsível que venhamos a ter menos população e a representar menos riqueza ao nível global. As projeções demográficas para 2050 apontam para que a população da União Europeia constitua cerca de 5,4% da população mundial, contra quase 7% hoje. E será uma população bastante mais envelhecida. De acordo com algumas projeções, em 2050 a economia mundial será dominada pelos três países com maior PIB: a China, os Estados Unidos e a Índia. Podemos até duvidar se dentro de 20 anos haverá ainda europeus sentados à mesa do G7.
Vivemos também um momento difícil na história da União Europeia, porque pela primeira vez um Estado membro decidiu sair. Se é uma decisão que respeito, é também uma decisão que me entristece: todos perdemos com a saída do Reino Unido. Mas temos agora de refletir sobre o rumo que a Europa deverá seguir com 27 Estados membros.
A Comissão Europeia lançou o debate através da publicação de um Livro Branco onde propõe cinco cenários para o futuro da Europa: (1) continuar como estamos, sem mudar o rumo atual; (2) reduzir a União Europeia ao mercado único, deixando de parte outras políticas; (3) permitir que os Estados membros que queiram colaborar de forma mais estreita o possam fazer; (4) fazer menos, mas de forma mais eficaz, restringindo a ação da União a apenas algumas políticas; (5) fazer mais, em todos os domínios de ação europeia. São expostas vantagens e inconvenientes para cada cenário, porque cada cenário é complexo, e reduzi-lo à banalidade dos debates habituais sobre o futuro da Europa, que acabam numa escolha binária entre "mais" ou "menos" Europa, não é sério nem esclarecedor. Digo-o com clareza: não há cenários ideais. Neste documento, ao contrário do que é hábito, a Comissão Europeia não toma posição. Não será a Comissão a dizer às pessoas o que devem pensar. De resto, no mundo digital em que vivemos, as pessoas já não querem que lhes digam o que pensar. Querem aceder à informação e tomar as suas próprias decisões.
É necessário que o debate seja esclarecedor. Infelizmente é demasiado tentador responsabilizar "Bruxelas" por decisões, às vezes impopulares, que os próprios Estados membros tomaram. É também por vezes difícil explicar com clareza "quem faz o quê", ou seja, as políticas e ações que são da responsabilidade dos países e as que são oriundas da União Europeia. Há assim, muitas vezes, um desfasamento entre as expectativas que as pessoas têm da Europa e o que a Europa pode de facto fazer.
No próximo dia 25 de março, terá lugar uma cimeira em Roma que celebra os 60 anos do Tratado de Roma. Tradicionalmente são os presidentes e primeiros-ministros dos Estados membros que decidem o rumo que a Europa deve seguir. Mas esta decisão tão fundamental para todos nós não pode ser tomada à porta fechada. A Comissão Europeia pretende por isso iniciar um processo com debates sobre o futuro da Europa nos Estados membros, em que os cidadãos possam refletir de forma madura, democrática e séria sobre o caminho que a Europa deve seguir. Um caminho que dê resposta às preocupações das pessoas. Terão de ser os europeus a decidir o seu futuro.
Comissário Europeu para a Ciência, Investigação e Inovação