Porque é que qualquer acordo de paz com o Israel é ilusório?
Al-Quds (Jerusalém) é a primeira qibla (a "direcção" para onde devem ser dirigidas as orações) de muçulmanos que tem sido ocupada pelo regime sionista desde 1948. A terra da Palestina foi testemunha de um dos incidentes mais prementes da história do Islão e do mundo contemporâneo. No dia em que a Nakba (a "catástrofe") prevaleceu em terras palestinianas e dominou a região da Ásia Ocidental, desde então tem praticamente acabado com o sossego e a tranquilidade para o seu povo. Durante mais de sete décadas da ocupação do território palestiniano, o regime sionista comprometeu-se e continuou a seguir esta política, construindo e expandindo colonatos sionistas e a desalojar a maioria dos palestinianos, profanando a mesquita de al-Aqsa, judaizando a cidade de Al-Quds e a Cisjordânia, mantendo o bloqueio da Faixa de Gaza, anexando ilegalmente os Montes Golã ocupado e procurando anexar grande parte da Cisjordânia.
A Questão da Palestina sempre foi uma das principais preocupações e questões não resolvidas do mundo islâmico e da nação islâmico-árabe, além de ser um dos assuntos mais antigos da agenda da ONU e de outras organizações internacionais. Logo após a Revolução Islâmica no Irão em 1979, o falecido Líder Supremo, Ayatollah Khomeini, apelou aos muçulmanos para que dedicassem a última sexta-feira do Mês Sagrado do Ramadão a revindicar os direitos dos povos oprimidos em todo o mundo - especialmente o direito do povo palestiniano a determinar o seu próprio destino. Este dia não é único no que diz respeito à Palestina. Como parte da cultura e história da luta do povo palestiniano, o 30 de Março marca o Dia da Terra na Palestina, que faz lembrar o protesto e a resistência dos palestinianos aos ocupantes. O Dia da Nakba, ou a "catástrofe", que marca o estabelecimento do regime ocupante nos territórios palestinianos em 1948, é outra ocasião para comemorar e defender o direito do povo palestiniano à autodeterminação. O Dia de Al-Quds, no entanto, é considerado como um ponto de viragem na luta e resistência do povo palestiniano contra a ocupação. É uma oportunidade na vida política palestiniana de reafirmar a luta e manter viva a resistência, apesar de mais de 70 anos de ocupação dos territórios palestinianos por colonizadores israelitas que sistematicamente ocuparam e confiscaram as terras dos habitantes originais da Palestina.
Este ano, o Dia de Al-Quds realizar-se-á a 7 de maio, uma vez que testemunhamos novos desenvolvimentos na Palestina que tornam a situação actual muito diferente dos anos anteriores. Um destes desenvolvimentos é o reconhecimento de Al-Quds como capital do regime sionista pelos EUA, um projecto que tem visado símbolos sagrados respeitados pelas religiões Abraâmicas sagradas do Islão e do Cristianismo e pelos seus aderentes em todo o mundo. O plano humilhante e anti-palestiniano do chamado "Acordo do Século" é também parte de um projecto de "diplomacia legitimadora" e de um programa ideológico para distorcer e perpetuar a ocupação de terras e desprezar os direitos palestinianos. O plano oferece uma oportunidade para os sionistas perseguirem o objectivo principal de tal diplomacia, que é legitimar a usurpação de Jerusalém e apresentar um rosto pacífico dos ocupantes, ao normalizar as relações entre alguns regimes árabes com Tel Aviv.
Desde 1973, vários planos de paz, de Camp David a Oslo, e planos mais recentes como o "Acordo do Século" e a normalização das relações com o regime israelita, foram experimentados, mas nenhum deles foi bem-sucedido, uma vez que os sionistas não têm qualquer intenção de pôr fim à ocupação e reconhecer os direitos palestinianos, devido à sua natureza e fundamento que se baseiam basicamente na ocupação e no expansionismo. Embora o povo palestiniano, frustrado por inúmeras propostas e acordos de paz, tenha transformado a sua confiança na força e resistência internas e na intifada (a "revolta") como métodos importantes e eficazes para realizar os seus direitos e mudar os velhos jogos na região, estamos também a assistir a uma mudança na estratégia dos sionistas a coberto da manutenção da paz para as suas ambiciosas aspirações através de esquemas enganosos, tais como a normalização das relações.
Os países do Golfo Pérsico que procuraram normalizar as relações com um regime ocupante e criminoso para fins políticos e de segurança, estão inconscientes desta importante facto de que a segurança da região se tornará mais frágil com a entrada do regime sionista como principal fonte de insegurança no Golfo Pérsico e a possibilidade de guerra, enquanto a probabilidade de desencadear um conflito com o regime sionista pode aumentar mesmo de uma forma acidental. Ou seja, enquanto os sionistas se firmam nas águas do Golfo Pérsico e, com isso, aumentam a ameaça à segurança, este cenário em nada altera o equilíbrio de segurança em favor desses mesmos países.
A questão de que o regime sionista escolheu e destacou a abordagem de normalização das relações com os árabes a esta altura, precisa de ser analisada de diferentes perspectivas. Em primeiro lugar, o regime sionista mantém há muitos anos relações informais com certos países árabes. Os desenvolvimentos dos últimos anos tornaram estas relações mais proeminentes e óbvias.
Em segundo lugar, com este acto, o regime sionista procura intensificar as divisões entre países islâmicos e árabes, que foram enfraquecidas mais do que nunca pela intervenção das potências ocidentais na região e pelo crescimento dos grupos terroristas apoiados pelo Ocidente nos últimos anos.
Em terceiro lugar, as visitas recíprocas de dirigentes sionistas aos países árabes e das delegações dos países árabes aos territórios ocupados também apagaram a fealdade das relações com o regime sionista e substituíram a causa da libertação dos territórios ocupados pelo espectáculo de pacificação do regime sionista, procurando criar um fosso entre os árabes e os muçulmanos, utilizando indevidamente as suas disputas e criando brechas entre grupos palestinianos.
Em quarto lugar, um dos objectivos mais importantes para o regime sionista na normalização das relações com certos países da região do Golfo Pérsico é que os direitos inalienáveis dos palestinianos sejam ignorados. Infelizmente, os grupos e governos que foram enganados pelo discurso deste regime criminoso e que foram apanhados em negociações e armadilhas de compromisso, comprometeram o destino do povo palestiniano e aumentaram ainda mais o seu sofrimento. Isto ocorre numa altura em que o surto da pandemia de coronavírus e a falta de acesso adequado a medicamentos e equipamento médico nos territórios ocupados da Palestina tornaram as condições de vida muito mais difíceis para o povo palestiniano.
Por fim, o objectivo a longo prazo de Israel e dos seus aliados e apoiantes destas manobras recentes é transformar a doutrina de aliança do cerco ao regime sionista pelos árabes para o cerco ao Irão e ao eixo de resistência pelos intimidadores Estados árabes e regime israelita. As acções subversivas levadas a cabo por este regime contra o acordo nuclear iraniano e as suas instalações nucleares, o assassinato de cientistas nucleares iranianos e os bombardeamentos cegos às forças de resistência na Síria fazem parte deste perigoso jogo.
Entretanto, o papel destrutivo do governo dos Estados Unidos, especialmente durante a era Trump, no apoio incondicional ao regime sionista não deve ser negligenciado. Embora o apoio do governo norte-americano a Israel seja contínuo e bipartidário, sem dúvida, os esforços de Trump para apoiar plenamente o regime sionista desde o início da sua presidência tem sido sem precedentes. Por exemplo, a implementação do plano de transferência da embaixada dos Estados Unidos em Israel de Tel Aviv para Jerusalém, o reconhecimento de Jerusalém como a capital de Israel, o reconhecimento da soberania israelita sobre os Montes Golã, território sírio ocupado, o "Acordo do Século", e a promoção da estratégia de normalização das relações entre os países árabes e o regime sionista, tudo isto ocorreu durante a administração Trump. Aparentemente, os Estados Unidos, através dos sionistas, procuram estabelecer um novo arranjo estratégico no Médio Oriente e pressionam para continuar a aumentar a pressão sobre a República Islâmica do Irão e o eixo da resistência, ao apoiar o plano de normalização e revelar as relações árabe-israelitas, a fim de alterar o equilíbrio de poder no Médio Oriente. No entanto, hoje, apesar de todos os esforços e os sete biliões de dólares americanos gastos na região, o equilíbrio tende a favorecer a resistência.
Em geral, e apesar da vergonhosa evolução das relações israelo-árabes, que procuram minimizar a questão palestiniana e desconsiderar os crimes perpetuados pelos ocupantes, o mundo está bem ciente de que a única solução real para a questão palestiniana será alcançada através da restauração dos direitos palestinianos por eles próprios e através da resistência até à realização dos objectivos de libertar os territórios ocupados e estabelecer um Estado palestiniano independente e livre com Jerusalém como sua capital.
A República Islâmica do Irão está firmemente convicto de que em vez de numerosos acordos de compromisso que foram aplicados desde os Acordos de Camp David ao delirante "Acordo do Século" e à normalização das relações entre alguns Estados árabes e o regime israelita, à custa de desconsiderar os direitos dos palestinianos sem resultados, uma paz justa e duradoura só será estabelecida na região na sequência da resistência com a retirada total da ocupação dos territórios palestinianos, o repatriamento dos refugiados, a determinação do futuro sistema de governo da terra baseado num referendo envolvendo todos os seus habitantes originais, e eventualmente, o estabelecimento de um sistema político integrado em todos os territórios palestinianos baseado no direito à autodeterminação.
A este respeito, desde há muito tempo, o Líder Supremo Ayatollah Khamenei propôs um plano para a Palestina com base na realização de um referendo no território ocupado em que todos os palestinianos - muçulmanos, judeus ou cristãos - decidem o seu próprio destino e futuro. Para concretizar esta solução, a República Islâmica do Irão apresentou oficialmente um plano iniciado pela Conferência Internacional sobre a Palestina, na qual propôs avançar com resolução através de um referendo nacional no território da Palestina ao Secretário-Geral das Nações Unidas, o qual foi distribuído como um documento do Conselho de Segurança a 4 de Novembro de 2019. A implementação deste plano consiste em quatro fases principais:
Implementar o direito do retorno dos refugiados palestinianos à sua pátria histórica.
Realizar um referendo nacional entre o povo da Palestina, incluindo os seguidores de todas as religiões, que habitavam na Palestina antes da emissão da Declaração Balfour, para a autodeterminação e determinação do sistema político.
Estabelecer o sistema político determinado pela maioria do povo da Palestina.
Decidir sobre o estatuto dos povos não-indígenas residentes na Palestina pelo sistema político eleito pela maioria.
A proposta do Irão denominada "Referendo Nacional no Território da Palestina", tem por base lógica nas relações internacionais contemporâneas e é utilizada para resolver disputas semelhantes noutros casos. O objectivo do Plano para um "Referendo Nacional no Território da Palestina" é fornecer fundamentos para que o povo da Palestina, independentemente de religião ou etnia, possa exercer o seu direito à autodeterminação. O futuro pertence ao povo palestiniano, e a sua legítima resistência, juntamente com o apoio do Eixo de Resistência e das nações muçulmanas, pode conduzir à independência e soberania sobre os territórios ocupados, num futuro não muito distante.
Embaixador do Irão em Portugal