Não confundamos "bom" ou "mau" acolhimento com diferenças culturais
Muito se tem noticiado sobre o acolhimento que os imigrantes, estudantes e turistas encontram quando chegam a Portugal, principalmente porque no caso dos imigrantes e dos estudantes isto é visto como determinante para a integração e para o sucesso profissional e escolar dos mesmos. No entanto, falar de acolhimento não é tão simples como parece porque, em primeiro lugar, é preciso saber diferenciar o acolhimento do país (ou seja, a hospitalidade de um povo, e aí é importante conhecer a cultura desse povo) do acolhimento que é dado, por exemplo, pelas instituições de ensino portuguesas aos estudantes estrangeiros (e nesse aspeto estas instituições têm de estar preparadas para recebê-los, independentemente da cultura do país que representam).
Nas entrevistas que realizei com estudantes brasileiros no ensino superior português, no âmbito do meu doutoramento, percebi que, quando perguntava sobre o acolhimento no país, alguns diziam que não tinham sido bem acolhidos, referindo aspetos da cultura portuguesa. No entanto, quando a pergunta era sobre o acolhimento da universidade, aí muitos nem se quer consideravam ter tido algum tipo de acolhimento. No primeiro caso foi fácil perceber porque alguns estudantes não viam de forma positiva o acolhimento em Portugal: venderam-lhes a ideia de que o Brasil e Portugal são países culturalmente semelhantes (e neste aspeto não só os antigos laços históricos/coloniais têm "culpa" como também a comunicação social, que insiste em propagar esta ideia). Portanto, ao chegarem a Portugal e depararem-se com as diferenças culturais (que não são poucas), a primeira reação é não compreender tratar-se de duas culturas diferentes mas dizer que o acolhimento é "ruim". Afinal de contas, se somos "tão" semelhantes, o que é mau para um brasileiro também deveria ser mau para um português.
Bem, então vamos lá... Sinto dececionar, mas brasileiros e portugueses não são "tão" semelhantes assim. Portanto, o que é "ruim" para um brasileiro pode perfeitamente não ser para um português. Eu diria mesmo que, o que na conceção de um brasileiro pode representar uma maneira "muito má" de acolher, na conceção de um português até pode representar uma maneira "muito boa". Ou seja, somos culturalmente diferentes e portanto não confundamos "bom" ou "mau" acolhimento com diferenças culturais. É óbvio que não me estou a referir aos atos discriminatórios, que infelizmente existem. Logo, é fundamental conhecer a cultura do país de acolhimento para não confundir esta "estranha forma de acolher" com discriminação.
Alguns estudantes, no entanto, conseguiram perceber essa diferença, relacionando a forma de acolher com o "jeito de ser do português": "Os portugueses dão as informações do jeito deles, mas dão. Eles não vão pegar na sua mão e dizer vem cá querido, que você vai ser acolhido, mas dão as informações de que você precisa..." Por isso mesmo, alguns que já haviam escutado "que os portugueses são muito diretos e objetivos, e que a gente interpretava muitas vezes como se fossem grossos (rudes)", conseguiram entender que "era uma questão cultural, ou seja, eles não estão sendo grossos, é outro tipo de relacionamento".
No caso do acolhimento prestado pelas universidades, ficou evidente que, apesar de estas terem cada vez mais interesse em atrair estudantes estrangeiros, ainda não estão preparadas para recebê-los. A começar pelo défice de informações, pois se para um aluno português (ou até mesmo da União Europeia) são óbvias, para os estrangeiros de países terceiros não são. Ou seja, um estudante de um país signatário do Processo de Bolonha está mais familiarizado com as "regras" do ensino em Portugal do que um estudante proveniente de um país que não tenha assinado este protocolo. Logo, o que pode dificultar a integração e o sucesso escolar desses alunos são as universidades não saberem lidar com as diferentes culturas que pretendem atrair, acolhendo todos como se fossem estudantes Erasmus. Portanto, é importante que os estudantes conheçam a cultura do país de acolhimento, mas também que as universidades conheçam a cultura de cada estudante de pretendem acolher.
Juliana Iorio é Jornalista, Doutoranda em Migrações pelo IGOT - Univ. Lisboa