Governantas
"Um homem não se consegue governar sozinho", resignava-se a minha avó, que passou grande parte da vida a cozinhar, a limpar e a arrumar. Dizia governar-se como quem queria dizer arranjar-se ou orientar-se. E dizia-o com uma certa condescendência. Coitados dos homens, como haveriam eles de se governar sem uma mulher em casa a passar-lhes as camisas a ferro e a fazer-lhes o almoço? Um homem tinha de pensar em assuntos importantes, tinha de trabalhar e ganhar dinheiro, tinha lá "as coisas dele" para fazer, precisava de alguém que lhe cuidasse das minudências. Alguém que tratasse do "governo da casa", essa arte cultivada pelas mulheres que (ainda há pouco tempo) liam os livros da Laura Santos, com títulos como Noiva, Esposa, Mãe ou A Mulher na Sala e na Cozinha, livros com capas duras e imagens de mulheres perfeitas, que ensinavam a tratar de bebés e a limpar os estanhos.
Ao longo de séculos, as mulheres tornaram-se especialistas em governar as vidas domésticas dos homens para que eles pudessem governar o mundo. Mas isso tem vindo a mudar. Aos poucos. Ainda temos um longo caminho a percorrer, mas se há coisa que aprendemos entretanto é que homens e mulheres têm capacidades semelhantes para limpar o pó e para apurar um refogado. E para fazer tudo o resto, na verdade. Para gerir empresas, para pilotar aviões, para serem o que quiserem ser.
Lembro-me de a minha avó me dizer para eu estudar e ser alguém: "Se tiveres um trabalho e ganhares o teu dinheiro, não tens de obedecer a nenhum homem e podes governar a tua vida como quiseres." Acho que ela, que ia sempre votar e nesse dia até tirava a bata e arranjava o cabelo para ir bonita exercer o seu direito, iria gostar de saber que nas últimas eleições foram eleitas 89 mulheres para o Parlamento português. As mulheres já não são só governantas, são também governantes.