O juiz

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A última vez que o Senado se recusou a votar o nome escolhido pelo presidente para juiz do Supremo foi em 1875, o que reforça a ideia de que o comportamento republicano no atual tempo político é anacrónico. Os bloqueios que foram montados a Obama só por muito boa vontade encaixam na categoria de contrapesos, tal foi a lógica destrutiva que moveu a maioria republicana no Congresso. A questão é o que acontecerá se os democratas recuperarem o Senado. Uma das prioridades será dar início à audição de Merrick Garland, o juiz escolhido em março pela Casa Branca para suceder ao falecido Antonin Scalia, e que ao ser aprovado desempatará a balança de oito juízes em favor do campo liberal. Claro que se Hillary vencer pode abdicar de Garland e escolher alguém mais marcadamente à esquerda, mas isso consumir-lhe-ia tempo e desgastá-la-ia mais e este não é o momento para empreitadas desnecessárias. Mas em que é que isto é relevante para o sistema político e para o próximo presidente? Tocqueville dizia que tudo o que começa político acaba jurídico, pelo que o Supremo manterá em mãos uma série de disputas ideológicas num tempo desfavorável ao entendimento partidário. Mais importante do que tudo, dada a veterania de vários juízes, é a hipótese de nos próximos quatro anos alguns deles renunciarem e a sua substituição sintonizar a agenda do presidente com o principal tribunal do país. Claro que isto é válido para Trump como para Clinton, mas não vale a pena esconder que o trumpismo político advoga legislação contrária às liberdades individuais, direitos civis, limites ao financiamento das campanhas ou à massificação do acesso à saúde. Se a tentação for subjugar o Supremo, esvaziando a separação de poderes e abrindo uma crise constitucional, então a próxima administração não terá um segundo de paz. Esta não é mesmo uma eleição igual às outras.

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