O mar oceano

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Nos dias 20 e 21 de setembro realizou-se em Lisboa um intitulado Oceans Meeting, iniciativa da ministra do Mar, oportunamente sob a definição do objetivo como Routing the Future, e com a indispensável intervenção da Marinha, que não tem faltado com o apoio de oficiais sabedores ao cuidado e interesse que mais de uma das nossas universidades têm dispensado ao tema, lembrando designadamente as de Aveiro, dos Açores, do Algarve. O número de participantes representava praticamente todos os países que aceitaram, na área científica, que Our Ocean, Our Common Future, designadamente Kitack Lim, secretário-geral da International Maritime Organization, Peter Thomson, enviado das Nações Unidas, Vidar Helgesen, representante da Noruega em nome do High- Level Panel on Building a Sustainable Ocean Economy, Vladimir Ryabinin representante da UNESCO, Vincent Bouvier, secretário- geral do Mar, de França, João Cravinho, antigo ministro português, Karmenu Vella, pela Comissão Europeia. Tratou-se, como vincou a ministra do Mar, de preparar a United Nations Ocean Conference, que terá lugar em Portugal em 2020, tendo como temas neste ato preparatório as Blue Circular Economy, Green Shipping and Port Tech Clusters.

A crise em que se encontra o princípio do respeito pelo conceito inspirador da Carta da ONU e da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de que a Terra é a Casa Comum dos Humanos, tem assim uma tentativa de resposta ao perigo específico que atinge os oceanos, considerados património comum da humanidade, e de facto, para lá dos eventuais conflitos de poderes políticos, transformados em vazadouro da humanidade.

Que o governo português tenha conseguido que tão importante reunião se tenha realizado em Portugal, não apenas apoia o que poetas como Fernando Pessoa ou Sofia de Mello Breyner afirmaram quanto ao facto de o mar ter em grande parte definido Portugal, como reconhece a importância da intervenção portuguesa no início das Descobertas portuguesas que conduziram à globalização atual, mas também o esforço científico das nossas universidades, em que se destacam as já referidas, e as instituições de ensino da Marinha: é finalmente um serviço à reposição de uma situação económica e financeira deste pequeno território que já foi chamado "cais de embarque". São histórias de investigadores estrangeiros, que vivem a atualidade, que falam desse passado, como Molyn Netwift ou Bailey W. Diffie que não omitem a importância de a talvez "mais pequena nação europeia" ter construído o maior império do século XVI, pelo que, com esta iniciativa governamental, mostra que, sabendo que os oceanos são "património comum da humanidade", existe um interesse nacional em ter a responsabilidade, juridicamente fundamentada, de lhe caber parte da gestão desse património.

Que a Marinha tenha estado presente e ativa no acontecimento não é apenas simbolismo, como não o é ter sido recordado o trajeto universitário do doutor Mário Ruivo, neste período de reorganização indispensável do globalismo, no qual a autoridade científica é mais importante do que a hierarquia das potências, para que a igual dignidade dos Estados seja inviolável. Por isso inverti a ordem das palavras na designação da minha intervenção, chamando-lhe Do Mar Português ao Mar Oceano. A coincidência da recente publicação do trabalho dos professores Pedro Calafate e Ramón Mandado Gutiérrez, com chancela da Universidade de Cantábria, abrangendo o período de 1511-1699, para definir o que chamaram Escola Ibérica da Paz, documenta a participação dos pensadores portugueses da época sobre a relação dos valores com a ação.

Como foi dito, com inspiração, no encontro por João Cravinho, trata-se de "o nosso oceano, o nosso futuro comum". Não posso deixar de recordar que o ultimato da Inglaterra, que mudou no século XIX o direito histórico pelo da ocupação efetiva dos territórios, pode ter nesta data uma eventual réplica que redefina a política das plataformas continentais em termos de afetar a legítima pretensão de Portugal obter a definição que sustenta para a definição da plataforma portuguesa. Aquilo que historiadores estrangeiros consideram como um milagre político, que foi a de esta pequena nação ter construído o maior império do tempo com a dinastia de Avis, não consente esquecer as oportunidades de afirmar a governança nesta séria busca de soluções para o mar oceano, demonstrando uma capacidade à medida da reivindicação de direitos. Este acontecimento vai nessa direção.

Adriano Moreira

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