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Em menos de um ano, o governo repôs a semana de trabalho de 35 horas na função pública, recuperou os quatro feriados perdidos com o executivo de Passos Coelho, subiu o salário mínimo. Desde que a troika saiu de Portugal, o salário médio aumentou para 838 euros, o valor mais alto de sempre - ainda que em demasiados casos longe do que seria uma compensação justa e capaz de melhorar o nível de vida das famílias portuguesas. Agora, as estruturas sindicais preparam-se para reclamar mais dias de férias para os trabalhadores e a CGTP ameaça voltar à carga com o salário mínimo para 600 euros. Não há nada de errado em tentar melhorar a vida dos trabalhadores. O problema é querer fazê-lo demasiado depressa, artificialmente, impondo às empresas mínimos que muitas delas não têm estrutura para aguentar. E fazendo orelhas moucas aos alertas dos empresários. O tecido empresarial português não é uma associação de malfeitores que esconde lucros chorudos enquanto escraviza os trabalhadores. As mudanças que teve de encaixar nos últimos tempos tiveram um preço. E a esse custo é preciso somar outros fatores determinantes para a saúde do tecido empresarial: continua a haver demasiada alavancagem, há parcas perspetivas de crescimento - o consumo interno que demora a arrancar e as exportações a desacelerar -, o ritmo de investimento tem muito pouca expressão. E a desconfiança que persiste em relação à capacidade de Portugal para cumprir as metas com que se comprometeu em Bruxelas é mais um escolho no caminho das empresas. Provocar mudanças quando não há condições reais para que aconteçam é sempre má ideia. Impor ao setor privado regras que dificultam a sua missão num momento de fragilidade económica e em que o país tanto precisa que recupere a pujança comporta demasiados riscos. Para o emprego, para o consumo, para o crescimento. O Estado não tem condições para se substituir às empresas - nem sequer para complementar o seu papel. Exigir-lhes o que não podem dar ou que pode comprometer o seu futuro é o caminho certo para o desastre.