O que falta e o que sobra a Costa
Marcelo Rebelo de Sousa procurou ontem dar uma lição de política a António Costa sobre o que o povo quer e não quer sobre a necessária ligação entre "o afetivo e o racional". No mesmo dia, o comissário Pierre Moscovici, na conferência de aniversário do DN, salientou a lição que António Costa deu à Europa sobre como fazer política. E assim, em duas penadas, se fez uma bela síntese do que falta e do que sobra ao primeiro-ministro de Portugal.
Sobra a capacidade para derrubar um dogma com mais de quarenta anos, o de que os comunistas nunca poderiam apoiar um governo socialista. Sobra a genialidade para transformar uma derrota numa vitória. Sobra o pragmatismo necessário para gerar os consensos com que se fazem e aprovam orçamentos e se cumprem as apertadas regras europeias com uma política de devolução de rendimentos. Tudo isto que António Costa tem de sobra surpreendeu os dirigentes europeus e, quase se pode dizer, fascinou Moscovici, que vê no primeiro-ministro português "um político muito talentoso".
Nessa perícia para manobrar nos bastidores da política sobra a ilusão de que se pode ganhar eleições à custa dos parceiros parlamentares e ainda assim mantê-los solidários e totalmente focados no combate ao centro-direita.
O que falta a António Costa é a capacidade de gerir e de gerar afetos. De conjugar pragmatismo com emoção. Falta-lhe dar tempo a si próprio. Falta-lhe perceber que ninguém pode ter sempre razão. Falta-lhe ter capacidade de encaixe, que nem sempre é sentido de humor, mas é também ser capaz de seguir em frente mesmo quando se julga insultado. E falta-lhe, como se viu no último debate quinzenal no Parlamento, capacidade para dizer com todas as letras o que lhe vai na alma.
Se as questões de carácter que Assunção Cristas tem posto em causa em artigos no CM o tiram do sério, falta-lhe dizê-lo de forma clara para que todos percebam a agressividade com que se dirige à líder do CDS-PP.