Delírios fiscais
Nem todas as boas notícias sobre a economia portuguesa têm sido suficientes para dar novo fôlego ao investimento em Portugal. Os números que o INE vai revelar amanhã indicam mesmo, sabe-se já, novo abrandamento num indicador que se tem mantido cronicamente baixo. "Precisamos de dar um salto equivalente ao das exportações", reconheceu ainda neste sábado Eurico Brilhante Dias, em entrevista ao DN/DV. Mas, se o governo já entendeu que é preciso lá chegar, parece continuar cego quanto ao maior obstáculo a essa inversão.
A justificação de Carlos César para uma primeira votação positiva à taxa sobre as renováveis - chumbada dois dias depois pelo mesmo PS, ainda que dividido - é bom exemplo da leviandade com que se trata estes assuntos (em nome da satisfação daqueles que garantem a maioria parlamentar). Foi para ganhar tempo que se ameaçou levar por diante o projeto do BE que, segundo a associação das empresas de renováveis, levaria à falência todo o setor. A boa notícia é que o PS pesou prós e contras, travou a fundo, deu uma guinada e deixou a coisa cair. A má é que isso não impediu que um investimento de até 400 milhões de euros se esfumasse.
A taxa sobre as renováveis é só um exemplo dos danos que a instabilidade fiscal tem causado. Conhecemos outros delírios que acabaram por ficar pelo caminho, como a ideia de criar um imposto sucessório para heranças de grande valor - que provocou uma corrida às doações e fuga de investidores no ano passado -, e sabemos de medidas que efetivamente avançaram, como o adicional ao IMI ou a subida da derrama do IRC para empresas com lucros superiores a 35 milhões (de 7% para 9%). E a cada nova ideia brilhante para acomodar as vontades da esquerda há um grupo de investidores que foge de Portugal a sete pés. Não tanto pelas medidas em si mas pela incerteza fiscal que continuamos a representar.
Somos um país que precisa desesperadamente de captar investimento estrangeiro e que até tem indicadores que animam, mas insiste em ter à porta uma massa de espinheiros que poucos estão dispostos a tentar ultrapassar. Atento, Marcelo alertou ainda ontem para os "sinais adversos ao investimento" - também nacional - que tem sido "o preço da estabilidade governativa".
Com uma dívida pública que se mantém nos píncaros e as empresas só agora a começarem a entender a importância da desalavancagem para a sua sobrevivência, desperdiçar uma conjuntura especialmente positiva - alimentada pela folga que nos é garantida pelos juros baixos e pela política de compra de dívida do BCE - com delírios fiscais é pôr em risco o futuro do país.