Objetivos em risco

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O Governo está a ficar isolado no seu otimismo em relação à economia portuguesa. A revisão em baixa das previsões de crescimento feita pelo Banco de Portugal (BdP) na sexta-feira veio no seguimento de outras efetuadas pela Comissão Europeia, OCDE e vários analistas internacionais.

O Governo projeta um crescimento de 2,4% para este ano, o que contrasta com a previsão de 1,6% do BdP, 1,8% da Comissão Europeia e 1,9% da OCDE. Dado que as receitas fiscais estão muito ligadas ao PIB nominal (e as despesas são mais rígidas e tendem a comportar-se em contraciclo), a um crescimento mais lento estará associada uma deterioração das contas públicas. É por isso que o BdP já admite um défice orçamental de 0,1% este ano. É um valor pequeno, que pode não se concretizar, mas Mário Centeno terá pretendido passar uma mensagem.

Até à divulgação do PIB do 1.º trimestre, não era um assunto que merecesse muita discussão. As campainhas tocaram porque os dados foram bastante piores do que esperado, sobretudo devido ao comércio internacional, que, um pouco por todo o mundo, tem revelado um comportamento incomum. Os ventos que vêm de fora não são favoráveis: a guerra comercial e as decisões de Donald Trump que tornaram os EUA um parceiro menos confiável adicionaram mais incerteza à economia global. Além das novas dificuldades em exportar para os EUA, as maiores economias da Zona Euro têm crescido pouco ou nada e o euro está forte, tendo já valorizado 10% este ano.

A economia portuguesa tem-se destacado nos últimos anos, com o turismo e a imigração a explicarem boa parte da performance acima da média. Tendo em conta os últimos dados disponíveis, o turismo permanece forte, mas sem as taxas de crescimento recentes. No que toca à imigração, tudo indica que se dificultará a entrada de pessoas, o que terá impacto na economia. Em termos de confiança, os indicadores mostraram uma recuperação em maio, mas tinha atingido em abril o valor mais baixo desde março de 2024. Finalmente, há que considerar o tema político: a ausência de uma maioria absoluta dificulta a implementação de medidas de consolidação orçamental. Aliás, a “minilegislatura” anterior ficou marcada por medidas fiscalmente expansionistas e o quadro parlamentar atual parece propício a mais do mesmo.

A situação não é desesperada. O rácio dívida/PIB é mais confortável e o deflator do PIB e a queda dos juros do BCE poderão dar um contributo importante em termos de execução orçamental. Já uma eventual resolução da “guerra comercial” conduziria ao aumento da confiança e ao acelerar da economia. No entanto, o alerta está dado e se o trimestre em curso voltar a desiludir, o objetivo de 2,4% do Governo poderá ficar impossível de alcançar.

Nota ao Leitor: Nas próximas eleições autárquicas serei candidato à presidência da Câmara Municipal de Matosinhos. Continuarei a escrever esta coluna de opinião acerca de economia e mercados financeiros e tentarei fazê-lo como até aqui: da forma mais independente e objetiva possível, sempre com a aspiração de poder ajudar e informar o leitor.

Economista conselheiro

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