O voto dos portugueses no estrangeiro merece mais respeito
Mais uma vez, Portugal ficou dez dias suspenso à espera da contagem dos votos dos portugueses recenseados no estrangeiro. A principal virtude deste sistema, pelo seu timing, é relembrar aos portugueses que somente 4 dos 230 deputados da Assembleia da República, representam a vasta diáspora portuguesa espalhada pelo mundo. Nestas eleições legislativas, havia cerca de 1,6 milhões de eleitores portugueses no estrangeiro. Destes, votaram 352.503, um resultado encorajador em relação às poucas dezenas de milhares do passado. Somente que mais de 113 mil votos dos emigrantes foram considerados nulos, representando 32,18% destes votos, um número elevado, embora menor do que nas legislativas do ano passado, quando essa percentagem atingiu os 36,68%. O círculo da Europa registou 32% de votos nulos e o de Fora da Europa 33%. A participação efectiva ficou em pouco mais de 15%.
Em 2024 a Comissão Nacional de Eleições (CNE) realizou um estudo, no qual apurou que o principal motivo de anulação dos votos era a ausência da fotocópia do documento de identificação. Que tipo de Democracia convive bem com uma taxa tão elevada de anulação dos votos, e a correspondente negação do direito de voto? E já agora, como podemos admitir que 13% dos portugueses sejam representados por 4 deputados em 230?
A solução poderá ser o voto por internet. “A implementação de soluções de voto eletrónico visa, sobretudo, conferir maior celeridade às operações de votação e apuramento, melhorar toda a gestão do próprio processo com vista a atingir ganhos de eficiência e, ao mesmo tempo, manter ou aumentar as garantias de segurança e credibilidade de todo o processo”, explica a CNE. Desta forma, o voto eletrónico pode “contribuir para que o cidadão eleitor exerça o seu direito de sufrágio de modo mais eficaz e cómodo, procurando, assim, combater algumas causas do abstencionismo que, no caso português, se têm vindo a evidenciar em alguns actos eleitorais”.
O voto eletrónico remoto tem vindo a ser exigido pelo Conselho das Comunidades Portuguesas (CCP) há décadas, para eliminar as dificuldades associadas ao voto postal e ao voto presencial. Uma resolução proposta pelo PSD para a realização de uma experiência para testar o voto eletrónico na emigração foi aprovada em fevereiro deste ano com a abstenção do PS e do PAN e a oposição Bloco de Esquerda e PCP.
Dia 28 de Maio, no Ministério dos Negócios Estrangeiros, a Comissão Temática dos Assuntos Consulares e da Participação Cívica e Política do Conselho das Comunidades Portuguesas, quis perceber a forma como a França, com um número similar de eleitores no estrangeiro, lida com o tema. Senão vejamos: nas últimas eleições legislativas de 2024, 1,57 milhões de franceses eram eleitores. Votaram 133 mil em 599 urnas repartidas pelo mundo, mas também 460 mil pela internet. Internet? Pois, estamos em 2024. Assim, a taxa de participação chegou aos 38%, com o voto por internet a representar mais de 3/4 do total. Elegeram 11 deputados. Em suma, a participação dos franceses é 2,5 vezes superior à dos portugueses. Não é só França que usa o voto por internet: 47% dos eleitores da Estónia escolhem a opção do voto por internet, que é usado também no Canadá, na Austrália, na Suíça, e em muitas eleições profissionais, sindicais e internas em partidos políticos pelo mundo fora. Esta solução é tão perigosa que até a … Ordem dos Advogados portugueses a usa para as suas eleições internas!
Portugal foi, desde 1976, um país pioneiro na integração no seu Parlamento de deputados eleitos pela sua diáspora. Entendemos que esta visão progressista no passado, hoje deixou de o ser. Ao não permitir à sua vasta comunidade de cidadãos nacionais no estrangeiro, participar de forma justa, eficaz e igualitária. Contudo devemos reconhecer que para as eleições legislativas se verifica um esforço do Estado Português e da sua democracia, em assegurar a contagem dos mais de 350.000 votos postais, com recurso a meios altamente tecnológicos e sofisticados. Ironia do destino, este cenário contrapõe-se diametralmente ao método arcaico e atrasado de todo o processo de envio e receção dos envelopes dos votos pelo correio.
Caberá agora ao novo Parlamento e ao novo, XXV Governo Constitucional de Portugal, encontrar soluções modernas para velhos problemas, para bem da democracia portuguesa!!
Coordenador da Comissão Temática dos Assuntos Consulares e da Participação Cívica e Política do Conselho das Comunidades Portuguesas e Presidente do Conseil Consulaire des Français du Portugal.