O veneno está na moda

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Não, num Brasil em que as fake news inventadas pela oposição atingem muito mais gente do que as comunicações oficiais do governo, o veneno de que se fala no título, desta vez, é mesmo literal e não metafórico.

Por exemplo, em Parnaíba, Piauí, a família Silva começou 2025 a comer, no almoço do feriado do primeiro dia do ano, o baião de dois, prato típico do nordeste brasileiro, consumido na noite de Réveillon da véspera.

A diferença, trágica, de uma refeição para outra estava na quantidade absurda de terbufós, um pesticida, acrescentada na manhã de 1 de janeiro ao baião de dois. Uma diferença que causou a morte de um rapaz de 18 anos e de duas crianças, de 3 anos e de 1 ano e oito meses, e o internamento de mais quatro pessoas, uma em estado grave e as outras com alta no mesmo dia.

Entre estas últimas, o suspeito do crime, Francisco da Costa, que, segundo a polícia, agiu motivado pelo ódio a uma das enteadas, a pessoa internada em estado grave, mãe das duas crianças assassinadas e irmã da vítima de 18.

Uma semana antes, no Natal, e noutro extremo do Brasil, em Torres, Rio Grande do Sul, as irmãs Maida e Neuza e a filha desta, Tatiana, morreram após a ingestão de um bolo carregado de arsénico preparado por Zeli, irmã das duas primeiras e tia da última.

Zeli, que está em estado grave, não é suspeita. Segundo a polícia, foi Deise Anjos, nora de Zeli, a responsável pelo envenenamento do bolo: o leite em pó e a farinha usados na confeção foram dados por ela.

No telemóvel de Deise, os investigadores encontraram buscas por arsénico. Após o crime, a polícia mandou exumar o corpo do marido de Zeli, sogro de Deise, falecido subitamente em setembro, e descobriram traços de arsénico no cadáver, razão pela qual já tratam a suspeita como assassina em série.

Ainda no Rio Grande do Sul, mas em outubro, um médico tornou-se arguido por matar a esposa com um sorvete envenenado e modificar a cena do crime com a ajuda do motorista da ambulância e do enfermeiro que atenderam a ocorrência.

Um mês antes, duas crianças ingeriram açaí contaminado com chumbinho (um raticida), no Rio de Janeiro. O suspeito, ex-marido da mãe de uma das vítimas, entregou-se à polícia.

Em agosto, dois casos: um homem foi preso após tentar matar um amigo com bombons envenenados também com chumbinho; e um médico detido sob suspeita de assassinar a ex-namorada com um milkshake envenenado.

Em maio de 2024, um empresário morreu após ingerir um brigadeirão, doce típico do Brasil, entregue pela namorada. A perícia apontou morfina no corpo. A namorada e uma vidente foram as mandantes, diz a Justiça do Rio.

No mesmo Rio, mas em junho, até cães, incluindo os do ator Cauã Reymond, foram vítimas de uma onda de envenenamentos por carne com chumbinho.

Seja por bala perdida, por violência policial ou, agora, por veneno, o que mais assusta é a facilidade com que se mata no Brasil.

Jornalista, correspondente em São Paulo

Diário de Notícias
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