Quero acreditar que os “vazios criativos” não são a ausência de conteúdos, ideias ou significados. São sim, um recorte temporal por preencher. Estes vazios são, ou deveriam ser, o momento no tempo e no espaço em que estamos intelectualmente disponíveis para preenchê-lo..Sinto que a predisposição do criativo para o preenchimento destes vazios é mais reduzida à medida que agosto se aproxima, pois o cansaço psicológico ganha ao cansaço físico e as dores do ecrã superam as dores das voltas matinais de bicicleta..O criativo apresenta um estado de espírito ao nível de uma alforreca que navega no nada, sem informação, sem cérebro, sem espinha dorsal. Movimenta-se ao sabor da maré, ora para um lado, ora para o outro sem perceber muito bem o que lhe está a acontecer..Ilustração: D.R. / Carlos Rosa.O recorte temporal que está, assim, por preencher é na verdade uma luta cega, surda e muda entre uma vontade avassaladora de recorrer a ajudas tecnológicas que lhe permitam atestar o cérebro de ideias, mas faltam-lhe as ideias que lhe garantem um pedido de ajuda na forma e no formato certo. Ou seja, precisa de atestar o depósito, mas não sabe qual o tipo de combustível a escolher e ali fica em modo alforrequeano a tentar esboçar um pensamento que lhe permita avançar..Quando o avanço se dá, entramos no momento da rejeição do nada, em que o vazio do criativo consegue mudar de linha e se preenche a partir do seu vazio, sem história, sem espólio, sem nada, e consegue assim ser autossuficiente e progredir para uma ideia. Para um conceito. Para um esboço..O criativo estava sem combustível - pensei eu, quando vi que o que já sabia, o esboço, o desenho, os riscos, são o meu ponto de partida..E, ao contrário das outras semanas, percebi tarde, mas percebi, que deveria ter invertido desde logo o processo e, ao invés do texto, começar pelo desenho. Porque o desenho serve para atestar o meu “vazio (do) criativo” com as ideias. Com as formas. Com as coisas. E na volta, estas coisas desenhadas ainda não foram inventadas, não têm nome e só existem mesmo neste papel!