O semestre de todos os perigos

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Por razões que alguns poderão explicar recorrendo ao ocultismo, à magia ou ao acaso, e que nós preferimos fundar em tergiversações sucessivas, tudo parece conjugar-se, em Portugal, na Europa e no Mundo para um semestre de todos os perigos.

A soberania americana caminha alegremente para um efetivo exercício de força no domínio comercial, do mesmo passo que retira apoios essenciais aos seus aliados. A Ucrânia e Gaza vão continuando a ser arrasadas enquanto o presidente americano diz “boutades” inconsequentes sobre a Rússia.

Portugal agora também terá entrado no radar neocolonial americano, com um embaixador que vai apresentar as suas cartas credenciais ao Presidente da República de Portugal, acompanhado de um manual de instruções sobre as opções políticas que Portugal deve ter.

A Europa, por seu turno, vai vendo as suas instituições enfraquecerem, com votações expressivas de censura à Comissão e com a indefinição orçamental agravada pela oposição da Alemanha.

As contradições que resultam das alianças fácticas expressas em votações no Parlamento Europeu, impõem aos deputados europeus que suportam e apoiam a atual Comissão um esforço acrescido para explicarem aos portugueses o que se está a passar e qual o caminho a seguir.

Portugal sem a Europa sobreviverá sempre. Pode é não ser o Portugal com que sonhámos desde o discurso de Mário Soares, em 1985, nos Jerónimos. E, isso, já é responsabilidade nossa.

Em Portugal, o próximo semestre conjuga também todos os perigos.

Não, o perigo não são as sucessivas eleições que vamos viver.

O perigo é uma certa vertigem, irreflexão e imediatismo que parece apoderar-se de muitos agentes políticos.

Portugal precisa de uma visão de longo prazo que nos conduza no caminho da criação de riqueza e da sua melhor distribuição, do desenvolvimento e da diminuição das desigualdades.

Infelizmente temos assistido a um certo leilão tático dos princípios, trocados pelo imediatismo dos resultados eleitorais.

Um certo radicalismo não democrático começa a ser legitimado em função de visões utilitárias de curto prazo.

A uma memória recente de restrições, dificuldades e de diminuição de rendimentos, parece suceder uma vertigem pré-eleitoral de “dar tudo a todos”. Acontece que este “dar tudo a todos” parece não ser o reconhecimento de um direito, ou, de uma contraprestação da nossa relação com o estado.

Antes, configura-se como episódica e discricionária “concessão régia”, modelo que julgávamos arredado da nossa vida coletiva pelo menos desde a revolução liberal de 1820.

E, neste ambiente em que a reflexão e o equilíbrio andam arredios, começa a surgir o que sempre se verifica nestas circunstâncias.

Um “carrossel” de notícias e artigos de opinião em que se misturam fontes anónimas “credíveis” com suposições; em que se misturam os desejos de alguns com a sua vontade de condicionarem a realidade. E, claro, tudo isto bastante distante do que os portugueses pensam.

Tudo ao serviço de uma certa ideia de que exercer legitimamente o poder, escolhido pelos seus pares, e ter direito a exercê-lo não são sinónimos.

Mas, este é outro perigo, bastante mais localizado, e a que voltaremos a 1 de Agosto, até porque, este ano importa que a silly season, não seja assim tão silly

Advogado e gestor

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