O que quer Trump?

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A questão tem sido colocada por muitos analistas, nos últimos dias, face à guerra comercial que o presidente dos Estados Unidos abriu contra a União Europeia, a China, o México, o Canadá e outros países. Alguns acreditam que o grande objetivo de Trump é desvalorizar o dólar, para tornar a economia americana mais competitiva, resolver a questão da dívida, relançar a indústria nacional e reverter o processo de globalização, pondo fim à ascensão da China e de outras potências emergentes. Outros consideram que Trump está a tentar obrigar o resto do mundo a pagar pelo privilégio de poder fazer negócios nos Estados Unidos, dando início a uma nova fase na sua existência como potência imperial, uma em que a América pura e simplesmente consegue tudo aquilo que deseja, seja a Gronelândia, a Faixa de Gaza, as terras raras da Ucrânia ou o TikTok. Já outros, mais dados a teorias alternativas, defendem que o objetivo de Trump é desinsuflar a bolha existente nos mercados e direcionar os biliões de dólares que estão a fugir das ações para as treasuries americanas, permitindo assim baixar as taxas suportadas pelos Estados Unidos. E há também aqueles que, como o seu ex-colaborador John Bolton, concluem simplesmente que Trump navega à vista e não tem uma estratégia bem definida.

Provavelmente, todas estas explicações terão o seu quê de verdade. O facto é que a maior potência mundial, que há 80 anos esteve na origem da ordem internacional e do processo de globalização que conhecemos, está hoje a fazer o caminho inverso, porque os seus atuais líderes chegaram à conclusão de que este processo histórico deixou de favorecer os Estados Unidos e tem de ser revertido.

Em suma, por razões que apenas a História permitirá avaliar devidamente, Trump decidiu virar o tabuleiro de xadrez ao contrário e recomeçar a partida com novas regras.

Porém, mais do que saber se Trump está certo, devemos olhar para os efeitos que as suas medidas protecionistas terão na economia global e, claro, na portuguesa.

Muito provavelmente, a economia global entrará, em recessão, ou no mínimo vai crescer mais lentamente. E, ao mesmo tempo, teremos um aumento da inflação, com os consumidores dos grandes blocos económicos a suportarem tarifas elevadas quando comprarem bens importados (é bom lembrar que quem paga as tarifas não é quem exporta, mas sim quem compra os produtos). Foram os bens de consumo baratos fabricados na Ásia que, em larga medida, permitiram o longo período de baixa inflação e de taxas de juro reduzidas a que nos habituámos nos últimos 30 anos. Com esta guerra comercial, é esse mundo que desaparece. E o aumento da inflação obrigará alguns bancos centrais a repensarem as suas políticas monetárias, sendo que, ao mesmo tempo, não terão grande margem para subir as taxas de juro sem causar ainda mais estragos na economia.

Neste contexto, Portugal continuará a ter algumas vantagens, com a segurança e a estabilidade do país, mas será de esperar algum impacto no turismo e em outras áreas-chave da nossa economia. Mais uma razão de peso para que das eleições de 18 de maio saia uma solução governativa estável. Os tempos não estão fáceis!

Nota: O imobiliário do Novo Banco continua a dar que falar, com a notícia, avançada pelo Correio da Manhã, de que vendeu um campo de golfe em Espanha por um euro, causando um prejuízo de 3,6 milhões de euros. É mais uma notícia que demonstra como os bancos estão hoje transformados, em larga medida, em grandes players do imobiliário, protagonizando negócios milionários que nem sempre vêm à luz do dia.

Diretor do Diário de Notícias

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