O Primeiro dos Bens!
" a medicina é a primeira das ciências enquanto a saúde fôr o primeiro dos bens".
Frase habitual nos corredores da Faculdade de Medicina, dita com muita presunção e água-benta, mais para aborrecer os amigos não estudantes de Medicina do que a convicção com que era dita quereria demonstrar.
Era utilizada pelos estudantes de Medicina como uma espécie de vingança contra os que diziam, um pouco jocosamente, que medicina era marranço e pouco mais.
Na realidade, até podemos aceitar que a medicina pode não ser uma ciência em si, mas sim um conjunto de ciências que promovem o conhecimento e que, devidamente agregadas, se transformam em Medicina. A Química, a Física, a Biologia, a Fisiologia, a Matemática, a Farmacologia, a Matemática, todas as ciências ditas exactas promovem o conhecimento através da experiência, da tentativa e erro, de mais experiência uma e outra vez, até chegar a um resultado final seguro.
A Medicina será, talvez, uma filosofia que une o conhecimento gerado pelas chamadas Ciências Exactas a uma base filosófica, com o serviço ao próximo, aos que sofrem, a ser o aglutinador e catalisador dessa união de conhecimentos.
A Medicina em si não é sinónimo de Saúde, mas contribui para a Saúde. Esta é definida pela Organização Mundial de Saúde como "um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não somente ausência de afecções e enfermidades". A saúde não é um bem individual; é um valor colectivo, um bem de todos, devendo cada um gozá-la individualmente, sem prejuízo de outrem e, solidariamente, com todos, tal como a Medicina e a Enfermagem e todas as áreas Especializadas que comungam as mesmas finalidades, são uma união de conhecimentos vindos de muita áreas distintas.
Por isso, falar de Saúde como mais um artigo de jogo político vai enviesar conhecimentos, pois as abordagens políticas não são, habitualmente, baseadas em conhecimento científico e sim, também habitualmente, em convicções de ordem pessoal que não passaram pelo crivo da experimentação, da hipótese conducente a uma tese testada e re-testada até um resultado seguro e fiável.
Mas, sendo, também, uma abordagem filosófica de convergência de conhecimentos, deve, por isso mesmo, ser esse o ponto de partida para uma abordagem global.
Podemos ter um hospital, um centro de saúde, um consultório muito bem acabados e muito bem equipados, mas se lá não habitar um conceito, de nada vale. Quer dizer, far-se-ão consultas e exames, mas não terão bons cuidados de saúde como resultado final.
Para que o resultado final seja eficiente e satisfatório, é necessária a conjugação de esforços de todos os intervenientes, incluindo o respeito pelo espaço de cada um, sem atropelos, em cooperação. A relação inter-pares é fundamental para a satisfação final do doente (utente em termos mais actuais e mais politicamente correcto), bem como de todos quantos são chamados a colaborar para essa finalidade. A motivação traz a satisfação, a desmotivação carrega a insatisfação.
A insatisfação dos profissionais que em conjunto trabalham para que a Saúde seja eficaz, conduz, inevitavelmente, à insatisfação do doente (utente).
E não é só por ser novo que passa a ser melhor.
Podemos ir num FIAT 600 novo ou num Mercedes topo de gama já com 120000 km (passem as publicidades) numa qualquer auto-estrada até a um qualquer destino desejado que, cumprindo as regras de boa condução, levaremos o mesmo tempo a percorrer os quilómetros desejados, mas provavelmente iremos mais confortáveis no segundo. Isto é, não é por ser novo que é melhor. Só é melhor se o conteúdo for melhor. Sobretudo o conteúdo humano.
Mas, muitas vezes, o "primeiro dos bens", serve para captar atenções, precisamente por ser um bem essencial ao bem estar físico, mental e social.
Uma estrutura nova pode ser uma forma de cuidados paliativos para uma mentalidade velha.
A vacinação anti Covid 19 demonstrou este aspecto: foi necessário encontrar uma mentalidade nova (o Almirante Gouveia e Melo) para reordenar o que parecia desordenado por uma mentalidade "velha".
Há que olhar para a pirâmide, tal como Maslow descreveu, de baixo para cima, começando pela base, e não de cima para baixo, só para satisfazer egos, transversais a todos quantos querem fazer sua "a primeira das ciências" (que já vimos não o ser) só porque necessitam de "satisfazer" o primeiro dos bens.
Podíamos, devíamos, sabíamos, fazer melhor.
E fizemo-lo quando chamámos o Almirante Gouveia e Melo.