O país precisa de uma RTP forte

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A recente demissão da Direção de Informação da RTP causou alguma celeuma, com o conselho de redação da estação pública a questionar a forma como o processo teve lugar. Há quem considere que se trata de uma possível ingerência do Governo no jornalismo da RTP e a Entidade Reguladora da Comunicação Social (ERC) vai ouvir o antigo e o futuro diretor de Informação, para apurar as circunstâncias em que a substituição teve lugar.

O facto de a demissão da direção de informação da estação pública de televisão estar a ser devidamente escrutinada não só é normal como desejável numa democracia. Significa que as instituições funcionam e estão a fazer o seu trabalho.

Dito isto, a mudança da direção é uma boa oportunidade para debater que televisão pública queremos.

Já aqui escrevi em tempos, numa posição que vincula apenas o seu autor, que a RTP é necessária porque faz aquilo que os privados não fazem, seja por falta de meios, seja por falta de interesse. A RTP tem meios humanos e técnicos para poder acompanhar temas que os privados não acompanham, tanto na televisão (RTP1, RTP2 e RTP3), como na rádio (Antena 1). É a única estação que consegue ter um jornalista a acompanhar até altas horas da noite uma eleição num sindicato. Muitas vezes, é a única televisão que consegue enviar uma equipa de reportagem para os confins de Trás-os-Montes, para cobrir um qualquer evento cultural numa aldeia raiana. Consegue produzir informação internacional de altíssimo nível, devido à qualidade da sua equipa em Portugal e dos correspondentes lá fora. Consegue não estar presa ao sensacionalismo e à febre dos comentadores residentes que falam sobre tudo e mais alguma coisa, embora também tenha os seus. Consegue elevar a fasquia, numa altura em que todo o setor dos media atravessa uma difícil crise e em que as grandes estações de televisão estão agora a sofrer o impacto - profundo, transformador e eventualmente demolidor - que a digitalização teve na imprensa há 15 ou 20 anos.

Podemos debater o modelo de financiamento da RTP, se deve ter ou não publicidade e competir com os privados, sobretudo tendo em conta a crise que o sector atravessa. Porém, se a RTP não existisse uma grande parte do que acontece no país real deixaria simplesmente de ter cobertura jornalística. Não tenhamos ilusões: este vazio não seria preenchido pelos privados, nem pela Lusa ou pelos jornais nacionais, regionais e locais que ainda resistem. Os discursos populistas que por vezes se ouvem a respeito da RTP ignoram a importância deste papel da estação pública como referencial de qualidade e como fator de coesão social de um país que não se resume a Lisboa, Porto e arredores.

Porém, a RTP só poderá cumprir plenamente esta missão se tiver resultados a nível de audiências que justifiquem o dinheiro público que ali é injetado. O facto de a RTP ter meios que mais ninguém tem só aumenta a sua responsabilidade. E aqui está um dos grandes calcanhares de Aquiles da RTP, que são os resultados do seu canal de informação. Segundo o Eco, em maio, a RTP3 teve um share de 1%, contra 1,5% do Now, que foi lançado há apenas um ano pela Media Livre. E contra 6,7% da CMTV, 2,8% da CNN e 2,6% da SIC Notícias. Em contrapartida, na rádio, a RTP/RDP tem tido resultados promissores: em 2024, a Antena 1 teve o maior número de ouvintes de sempre, graças ao crescimento dos seus canais digitais, o que mostra que é possível dar a volta e reinventar a forma como se trabalha.

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