O ovo, a galinha e o Lula

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Na campanha de 2022, Lula da Silva prometeu que os brasileiros iam “voltar a comer picanha”, um slogan básico, mas que atingiu o alvo porque despertou no eleitorado a memória dos dois primeiros governos do ex-sindicalista, quando cerca de 40 milhões de brasileiros, até então miseráveis ou quase, passaram a conseguir comprar frigoríficos, televisões, carros, viagens de avião, além dos cortes mais nobres da vaca nos churrascos de domingo.

Três anos depois, com Lula eleito, aqueles brasileiros mal conseguem comprar a proteína supostamente mais barata, o ovo. Em vez de picanha a preço de galinha, a galinha está a preço de picanha. Lula pensou então nos últimos dias noutros slogans: “Vamos prender o pilantra que está a aumentar o preço do ovo”; e “a galinha é a menos culpada”.

“Alguém está sacaneando as galinhas, porque essas galinhas que botam ovo, elas ficam trancadas, coitadas, ficam pondo três ovos por dia, só comendo, bebendo água e pondo ovo, não deixam nem a coitada descansar, e agora vêm jogar a culpa em cima da galinha?”, disse num evento em Sorocaba, São Paulo. “Eu ainda não encontrei uma galinha a pedir aumento do ovo, a coitadinha sofre, ainda canta quando põe ovo, mas o ovo está saindo do controle, tem ladrão passando a mão, eu estou atrás disso, porque eu gosto de ovo, como dois por dia”, acrescentou em Campo do Meio, Minas Gerais.

No melhor estilo populista, Lula dá receitas simples - vamos pegar o ladrão das galinhas - para questões complexas: segundo especialistas do Centro de Estudos Avançados em Economia k yAplicada ouvidos pelo jornal O Estado de S. Paulo, o aquecimento global matou galinhas de calor e deixou-as menos produtivas, houve um surto de gripe aviária nos EUA que aumentou muito a procura no gigante norte-americano e, com o preço do ovo a aumentar no estrangeiro, os produtores exportam mais para lucrarem mais, a colheita do milho caiu, a ração ficou menos nutritiva e o animal passou a pôr menos ovos, além de a inflação ter afetado até o preço das embalagens.

“Eu agora estou muito preocupado com o preço dos alimentos, estamos fazendo muito, ontem foi feita uma reunião no Palácio com muitos ministros, muito empresários”, continuou Lula.

Tem razões para ficar preocupado, uma vez que, na campanha de 2022, os tempos de antena do hoje presidente repetiam que, com o rival Jair Bolsonaro no poder, o que se levava antes num carrinho de supermercado passara a caber num saquinho. E ainda faziam trocadilhos como “Bolsocaro”.

Agora, é a vez dos bolsonaristas cantarem, como na esvaziada manifestação a favor do ex-presidente de Copacabana de domingo, dia 16, “se com Lula está tudo caro, volta Bolsonaro”.

E mais: logo após eleito, Lula previa dois anos, 2023 e 2024, para arrumar a casa e outros dois, 2025 e 2026, para já voar como um falcão nas sondagens de popularidade. Afinal, as pesquisas mais recentes mostram o presidente a ensaiar um mísero voo de galinha.

Jornalista, correspondenteem São Paulo

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