O jogo do tudo ou nada
A crise política a que estamos a assistir resulta de uma estratégia de “tudo ou nada” que, a determinado momento, foi decidida pelos líderes dos dois principais partidos, Luís Montenegro e Pedro Nuno Santos.
Ambos tomaram esta decisão, cada um do seu lado, porque acreditam que poderão sair a ganhar com a ida a votos. O primeiro-ministro estará convencido de que é preferível ir a jogo agora, enquanto as cartas lhe são aparentemente mais favoráveis, do que deixar-se grelhar em fogo lento por uma Comissão de Inquérito e, na melhor hipótese, sobreviver politicamente até ao início do próximo ano. Para depois, sem glória, cair finalmente às mãos do sucessor de Marcelo na Presidência.
Por outro lado, embora não estejamos em 1987, Montenegro contará com a habitual simpatia do eleitorado para com os primeiros-ministros a quem a Oposição não deixa governar. Tentará, também, apelar aos eleitores que gostariam de poder assegurar o futuro dos filhos, deixando-lhes empresas e comprando-lhes apartamentos, algo que, num país onde os laços familiares têm muita relevância, não deixará de ser compreensível para muitas pessoas. Claro está que a maioria dos portugueses não tem meios para o fazer, nem tão pouco para pagar 750 mil euros a pronto para comprar os ditos imóveis, mas isso será outra discussão.
No entanto, não é certo que os eleitores fechem os olhos ao facto de um primeiro-ministro ter uma empresa familiar que recebe avenças de grupos económicos. Claro que Montenegro pode evocar os exemplos de Balsemão e de Soares, que tinham empresas familiares enquanto lideravam o Governo, legislando em assuntos que diziam respeito a esses negócios, mas a atividade da Spinumviva ainda não está devidamente explicada e muita gente tem dúvidas sobre os serviços efetivamente prestados pela empresa e em que condições o fazia.
O certo é que Montenegro decidiu-se pelo tudo ou nada, preferindo a ir a jogo agora, enquanto tem mais hipóteses de sucesso, do que dentro de seis meses ou um ano.
Do outro lado da barricada, Pedro Nuno Santos também optou por jogar o seu futuro político nestas eleições antecipadas. No caso de Montenegro, é fácil perceber o que será considerado uma vitória. É ter um resultado que lhe permita a recondução no Governo. Mas é difícil perceber o que pode ser considerado, ou não, uma vitória para o PS. Será ter mais mais votos que o PSD, mesmo que não consiga formar governo? Será manter o mesmo número de deputados? O que ganhará o PS com estas eleições antecipadas? E quem terá mais a perder nestas eleições? Montenegro, que vai agora a jogo por ser esse o mal menor, ou Pedro Nuno Santos, que poderia ter mais a ganhar em ir a votos dentro de seis meses ou um ano? O futuro dirá.
Diretor do Diário de Notícias