O décimo membro do clube nuclear

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Faltam menos de dois meses para os 80 anos das bombas atómicas em Hiroxima e Nagasáqui. Dessas bombas atómicas lançadas pelos aviões americanos sobre as cidades japonesas, forçando a rendição que levou ao fim da Segunda Guerra Mundial, passou-se depressa para as bombas nucleares. E este “passou-se”, via tecnologia militar, significou uma capacidade destrutiva muito maior, até milhares de vezes maior, que traria um sofrimento inimaginável se as bombas nucleares fossem usadas, basta pensar no horror que viveram os habitantes de Hiroxima e de Nagasáqui.

O monopólio americano desta terrível arma durou só quatro anos. Pelo mérito conjugado dos seus cientistas e dos seus espiões, a União Soviética testou a sua primeira bomba em 1949. Há quem diga que foi nesse momento que começou a Guerra Fria, pois o risco de uma confrontação nuclear obrigou as duas superpotências a evitar uma guerra quente entre ambas, preferindo choques controlados, fosse na Coreia, no Vietname ou no Afeganistão, tudo tragédias imensas, mas muito longe de significarem o fim do planeta. Dessa rivalidade, em que os arsenais nucleares se enchiam de bombas, cada lado procurando suplantar o outro, são testemunho as mais de 5000 ogivas, cada, que americanos e russos mantêm.

A proliferação nuclear tornou-se inevitável. Os britânicos avançaram logo. Os franceses pouco depois. Em 1964, os chineses também já tinham armas nucleares. A dado momento, embora sem o admitirem até hoje, os israelitas juntaram-se ao clube. Assim, se era suposto as potências nucleares oficiais serem cinco, ou seja os cinco vencedores da Segunda Guerra Mundial, que são também os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança, depressa se percebeu ser impossível. Em 1974, a Índia testou a bomba, que confirmou com uma série de ensaios em 1998, com o vizinho Paquistão em simultâneo a assumir que também já era senhor do poder nuclear e, portanto, a rivalidade vinda desde 1947, e expressa em três guerras, passava para um outro patamar. Finalmente, em 2006, um nono membro anunciou-se com estrondo: a Coreia do Norte.

Entre americanos e soviéticos, e também entre indianos e paquistaneses, o poder nuclear trouxe a dissuasão. A Guerra Fria nunca aqueceu, e às três guerras indo-paquistanesas não sucedeu uma quarta. À Coreia do Norte a bomba trouxe a sobrevivência do regime. A dinastia dos Kim, oficialmente comunista, sente-se mais protegida contra o mundo exterior do que antes de ter a bomba. O país é hoje temido e mesmo Donald Trump, no primeiro mandato, chegou a fazer cimeiras com Kim Jong-un. O nuclear faz medo e por isso dá estatuto, foi a mensagem.

Se o Irão está próximo de ter a bomba continua uma incógnita. Há quem pense que agora, depois do ataque por Israel, sim, vai avançar finalmente para esse objetivo. A não ser que os bombardeamentos dos últimos cinco dias tenham, de facto, destruído as instalações e eliminado os cientistas-chave. Tal como os Kim, também os ayatollahs sabem que a sua sobrevivência teria mais hipóteses se houvesse capacidade de dissuasão. Muammar Khadafi na Líbia e Saddam Hussein no Iraque tentaram ter armas nucleares e acabaram por desistir. Ambos, depois, foram derrubados por ações do Ocidente, e se o primeiro acabou linchado, o segundo foi enforcado. Teria sido diferente com a bomba?

Israel decidiu que o Irão, fosse qual fosse a intenção do enriquecimento do urânio, não teria nunca a bomba. E boa parte do mundo não esconde ver com agrado o fim das possibilidades nucleares do grande país que é herdeiro da Civilização Persa, a começar pelos vizinhos árabes. A guerra, porém, continua. Falta ainda uma certeza absoluta a Israel.

Tal como vai continuar, de certeza, a haver países que ambicionarão a arma nuclear. No passado, brasileiros e argentinos tiveram programas militares. E também a África do Sul, na era do regime do Apartheid, procurou a bomba. Ucrânia e Cazaquistão renunciaram a tê-la, depois de herdarem parte do arsenal soviético (especula-se que também os sul-africanos desistiram dela depois de a ter). Haverá um dia um décimo membro do clube nuclear? É provável. Há 80 anos que é uma tentação. Que do ter não se passe nunca mais ao usar.

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