O digital, o marketing e a política
Neste tempo em que vivemos, somos assaltados constantemente por mensagens exteriores que condicionam totalmente as nossas convicções, as nossas decisões e as nossas acções.
A evolução que registaram as técnicas de marketing para conseguirem levar-nos a comprar determinados produtos e a comprá-los cada vez mais levou a um profundo conhecimento das reacções humanas aos estímulos da comunicação, ao ponto de estarmos constantemente a ser comandados na nossa vida.
A nossa reacção ao consumo de determinados produtos ou à exclusão de outros da nossa dieta diária tem só a ver com a capacidade de comunicação que têm os seus promotores e pouco a ver com o conhecimento real que temos sobre os próprios produtos.
Ao longo dos anos fomo-nos habituando a confiar nas informações que nos chegavam com origem em pessoas que conheciam as diferentes realidades e que se pautavam por um compromisso sério com a verdade, fosse por convicção ou fosse por receio de perder a honra no meio dos seus pares.
Com a democratização da informação, a evolução digital e a permissividade da sociedade em que vivemos, essa obrigação de dizer a verdade e de defender a sua honra deixou de ser, para muitos, o critério do seu comportamento e o resultado passou a justificar os meios utilizados.
Em muitos outros momentos da história foram vividas situações semelhantes, sempre em momentos de grande frustração da população, em que todos esperam um salvador e, por isso, estão mais disponíveis em acreditar mais no que lhes agrada do que na realidade.
No passado, a técnica usada era quase sempre o aproveitamento da falta de informação.
Hoje, as tecnologias não permitem a inibição do acesso à informação e, por isso, a nova arma é o excesso de informação e a aposta na informação falsa que agrada aos que estão descontentes.
Durante a última semana tivemos uma oportunidade única de confirmar esta forma de estar na política.
Por um lado, assistimos a um congresso do partido que nos governou durante os últimos oito anos a garantir que tudo o que não fizeram durante esse tempo não foi culpa sua e que na próxima legislatura é que será tudo resolvido e todos viverão muito melhor.
Noutro evento desse mesmo fim de semana, foi apresentada uma alternativa de governo para Portugal, em que se afirma que tudo o que de errado se viveu durante os últimos anos deve ser reformado e aonde se apresentou, sem a preocupação do espectáculo, uma solução credível para a sua realização.
Por fim, no último fim de semana, assistimos a um outro congresso de um partido que se tem afirmado pela contestação, aonde ouvimos muitas críticas ao governo anterior e que são, na maioria, muito verdadeiras, mas aonde as soluções apresentadas são por todos reconhecidas como impraticáveis e impossíveis.
Como ainda não houve nenhuma sondagem sobre a posição dos eleitores depois destes acontecimentos, ainda não posso concluir qual o efeito que criaram estes eventos na sua percepção. Mas a ver pelos comentadores que ouvi e que valorizaram o espectáculo do congresso do Partido Socialista e o êxito do seu novo secretário-geral, que se sentiram agredidos pelo congresso do partido de contestação e que consideram que o lançamento da AD não foi mediaticamente interessante, acredito que a mensagem que passou é mais uma vez condicionada pela capacidade de marketing e assim propagada pelas redes digitais.
Se queremos verdadeiramente viver melhor, é fundamental aprendermos a viver nestes tempos modernos.
Por um lado, nós, comuns mortais, temos de saber escolher o que nos serve e não o que nos tentam vender.
Por outro lado, os políticos têm de compreender que, para além de uma proposta séria de governação, têm de ser capazes de apresentar essa proposta de uma forma adaptada ao que o mercado está habituado.
Tem de ser interessante e apelativa, não basta ser séria.
Se não formos capazes, ganhará de novo o marketing e o digital e perderá a política.