O destino ocidental da Roménia, 35 anos após fim de Ceausescu

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Estamos a poucos dias dos 35 anos da Revolução Romena. Em conversa, em tempos, com Petre Roman, que foi primeiro-ministro entre 1989 e 1991 e ficou como um dos rostos dessa Revolução, perguntei sobre Nicolae Ceausescu e a mulher, Elena, julgados sumariamente e executados no dia de Natal. “A morte de Ceausescu era inevitável, porque até ao final foi um ditador sanguinário”, foi a resposta de Roman, de passagem por Lisboa. Falámos em espanhol, pois é filho de uma espanhola e de um romeno que combateu contra os franquistas na Guerra Civil.

Naquele momento do fim do comunismo, ainda jovem, com ar de galã de cinema, falante de várias línguas, Roman foi uma boa ajuda para o novo presidente, Ion Iliescu, apresentar a sua Roménia aos olhos do mundo. Houve mortos nas ruas, um ditador executado, mas os historiadores nunca deixaram de expressar dúvidas sobre o que se passou exatamente em finais de 1989, até porque muitos dos dirigentes comunistas se mantiveram nos círculos de poder, mesmo que com novas vestes de salvadores nacionais depois convertidas em sociais-democratas.

“Era o sonho de a Revolução Romena reintegrar o país na Europa. E conseguimo-lo, mas com sacrifícios. Às vezes foram sacrifícios demasiado grandes, não por culpa da Europ,a mas sim dos políticos romenos. Foi uma reintegração também demasiado lenta. Eu, como primeiro-ministro entre 1989 e 1991, tinha uma visão estratégica e um plano de ação que contava aplicar em sete anos. Mas foram muitos mais e, por isso, se perdeu muito. Mas o grande resultado da Revolução Romena e da política romena pós-1989 é este mesmo: integrar a UE e a NATO”, afirmou Roman na tal conversa, admitindo que o país demorou a encontrar o seu rumo, mais do que o pensado de início.

A adesão à União Europeia aconteceu em 2007, enquanto a entrada na NATO deu-se ainda em 2004.

Demorou a encontrar o rumo, mas encontrou. É essa a minha convicção. Pelo que vi nas vezes que visitei a Roménia, pelo que ouço dos romenos com quem falo, pelo que conheço da História de um país que se orgulha da latinidade e do que isso significa enquanto destino Ocidental.

Aliás, para a Moldávia, pequena ex-república soviética que tem uma maioria de população de língua e cultura romenas, o exemplo da vizinha Roménia é decisivo na opção de entrar um dia na UE, confirmada este ano em referendo e com a reeleição da presidente Maia Sandu, apesar da força de políticos pró-Rússia, capazes de surpreender na captação de votos. 

Surpreendentemente, a força dos políticos avessos ao Ocidente e defensores de uma acomodação com os interesses russos também se fez sentir nos últimos tempos na Roménia, nomeadamente com a vitória na primeira volta de Calin Georgescu, um candidato que fez campanha sobretudo através das redes sociais e obteve 23% dos votos a 24 de novembro.

Georgescu rejeita qualquer tipo de ligação à Rússia, tal como a Rússia pretende nada ter que ver com o que se passa na Roménia, mas depois da divulgação de documentos secretos sobre uma maciça campanha organizada do exterior para influenciar o voto, o Tribunal Constitucional anulou o escrutínio, pelo que não se realizará este domingo a segunda volta entre Georgescu e a centrista pró-UE  Elena Lasconi.

Novas Presidenciais deverão ser organizadas em data a anunciar e adivinham-se tempos de incerteza na Roménia, por muito que o primeiro-ministro cessante, Marcel Ciolacu, elogie a decisão, e que o presidente Klaus Iohannis declare que permanecerá no cargo até ser eleito um sucessor e garanta que o país continua solidamente comprometido com a União Europeia e a NATO.

Também houve Legislativas, mas apesar dos bons resultados dos partidos eurocéticos, os sociais-democratas de Ciolacu foram os mais votados e parecem em condições de formar governo, até porque o Tribunal Constitucional não se pronunciou sobre estas eleições, que se realizaram no domingo passado.

Já falei da fragilidade da Moldávia, em que a posição pró-UE foi ameaçada há pouco, e também há o caso da Geórgia, país que, tal como a Moldávia, coloca bandeiras da UE nos edifícios públicos, mas agora viu o governo adiar as negociações para adesão, decisão contestada pela própria presidente e nas ruas.

São dois países que lutam há muito por sair da esfera de influência russa, e ambos são  importantes para o Ocidente, mas a Roménia, país da UE e da NATO, vizinho da Ucrânia e abertamente crítico da ação russa em território ucraniano, tem toda uma outra importância geopolítica. Convém estarmos muito atentos ao que se vai passar nos próximos tempos nesse pilar do flanco leste da NATO, 35 anos depois da Revolução Romena.

Diretor-adjunto do Diário de Notícias

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