O Desporto é inclusão e 'fair-play'? Sim, e é pelos jovens que se começa
"Hoje foi um bom dia para vocês virem cá. Sabem, o meu sonho é jogar futsal e as pessoas verem-me na televisão.” Para o leitor esta frase pode parecer banal, mas não é. O seu autor é um atleta de boccia, uma modalidade praticada por desportistas com paralisia cerebral e que no sábado passado fez parte de um treino muito especial, certamente marcante para todos os que nele participaram.
Por coincidência, num fim de semana em que muito se falou da atitude de Pepê, o jogador do FC Porto que decidiu parar uma jogada quando corria isolado para a baliza do Estoril Praia depois de o seu adversário direto ter caído devido a uma lesão, numa demonstração de fair-play que só enobrece o atleta, uma equipa de jovens aspirantes a futebolistas teve um treino diferente, o qual terá sido uma lição para perceberem como outras pessoas se superam para praticar desporto. E aprenderem a respeitá-las como são.
Primeiro uma declaração de interesse: o meu filho mais novo integra este grupo de atletas da equipa de Sub-13 (crianças com 12 anos) do Clube Desportivo Cova da Piedade que no sábado passado tiveram uma manhã diferente: não jogaram num campo de futebol, mas sim praticaram desporto num pavilhão enfrentando desafios diferentes daqueles com que são confrontados semanalmente.
A proposta do clube foi simples: levar o grupo ao Pavilhão da Escola Básica 2, 3 Dr. António Augusto Louro, no Seixal, onde treinam os atletas da Escola de Boccia da APCAS (Associação de Paralisia Cerebral de Almada Seixal), conhecendo assim jogadores de várias idades que superam as suas deficiências para praticar desporto.
Foi uma manhã muito diferente: experimentaram Slalom em Cadeira de Rodas (guiados por uma jovem atleta da Associação, que espalhava boa disposição) e disputaram entre eles Futebol para Cegos - usando óculos e vendas que os impedia de ver tendo de se guiar pelo som que os guizos colocados na bola faziam -, situações que os obrigaram a perceber que tinham de se ajudar para conseguir o objetivo: trocar a bola entre eles. Desafio pouco conseguido, já agora.
Esta jornada de promoção de inclusão - e uma experiência que, espero, os tenha marcado - terminou com a prática de boccia, aqui com a companhia de atletas desta modalidade paralímpica. Distribuídos por três áreas, os jovens atletas do Cova da Piedade aprenderam as regras e objetivo do jogo, com alguns dos desportistas da casa a explicarem-lhes, da forma como podiam devido à sua deficiência, como deveriam atuar.
Foi bonito ver os miúdos atentos às explicações e os elementos da “casa” a dizerem-lhes como deviam fazer e, até, a protestar com o juiz uma eventual falta (no caso o pisar de uma linha) de um aspirante a futebolista mais distraído.
Este dia de sensibilização para a inclusão e respeito por cidadãos que apesar das suas deficiências não deixam de ser desportistas como eles, com sonhos e objetivos, terminou com um pai na baliza de futsal e os miúdos a tentarem marcar golo. Mas marcantes foram os momentos em que o aspirante a jogador de futsal quis rematar e, quando o fez, toda a equipa o incentivou batendo palmas e gritando o seu nome. Não interessa se marcou ou não, a cara de felicidade foi suficiente para a iniciativa ter sido uma aposta ganha.
É claro que o Cova da Piedade não será o único clube do País a protagonizar ações de inclusão, mas permitam-me destacar esta jornada de formação de jovens que diariamente, na escola e na sua vida, encontram colegas com dificuldades, de vária ordem, esperando que quando ouvirem a frase “todos diferentes, todos iguais” percebam não ser esta mais uma frase, mas sim um modo de vida.
E se tiverem dúvidas sobre isso lembrem-se da alegria do jovem que tem o sonho de jogar futsal.