O comandante que nos falta
Não é por acaso que a Europa é designada por Velho Continente. Tantos séculos a moldar a civilização, na sua versão ocidental, resultaram num extraordinário repositório cultural, mas também no mais profundo dos poços de vícios. A complexidade do xadrez do poder é tal que as peças se vão anulando, fazendo com o novo normal seja o impasse.
Se tiver de nomear o maior dos problemas da Europa, à data de hoje, não vacilo por um segundo: falta de liderança. Para ser mais concreto, falta-nos um líder forte, com uma mensagem mobilizadora e inequívoca. Por comparação - independentemente de se gostar ou não do personagem -, falta no Velho Continente um homem ou uma mulher que grite algo equivalente ao MAGA - Make America Great Again - de Trump.
Os aprendizes de líderes que por cá andam são fracos ou vaidosos. Nalguns casos, são as duas coisas. Não é com Macron, Scholz ou Meloni que lá vamos. Nem com Sánchez ou Tusk. Ainda menos com Starmer, mesmo considerando o Brexit. Este vazio de liderança acaba por deixar o palco a duas personagens não eleitas (por sufrágio direto, entenda-se): os recém-empossados Ursula von der Leyen, a presidente da Comissão Europeia, e António Costa, o presidente do Conselho Europeu.
Vistas as coisas, ainda bem que são estes dois e não outros. São democratas, competentes, experientes e consensuais, o que é uma boa notícia para a Europa. Se se souberem articular, ela na dimensão executiva, ele na dimensão da concertação política, poderão ser a chave possível para os próximos tempos. Mas não são a solução. A União reclama uma figura que traga o efeito “WoW”, que surpreenda, inove e mobilize, que nos faça acreditar no nosso papel no mundo e arregaçar as mangas para o realizar.
Os desafios são mais que muitos, numa Europa que parece estar sitiada. De um lado, os Estados Unidos ameaçam passar de aliados a ferozes concorrentes. Trump regressou mais legitimado do que nunca e, nesse particular, Costa poderá ser um interlocutor com a paciência e o talento negocial necessários para moderar os ímpetos do americano. Do outro lado, a Rússia não dá tréguas à Ucrânia e já percebeu que a inação europeia lhe permite extremar o conflito, ao ponto de ter trazido para o campo de batalha, às portas da União, tropas do inenarrável regime norte-coreano. Do oriente, a ofensiva económica da China ameaça também fazer estragos numa Europa que cuidou pouco da sua autonomia estratégica. E aqui à porta, a sul, o evoluir da situação em Israel, sobretudo a possibilidade de um confronto aberto com o Irão, poderá ser catastrófica. Basta imaginar o que representaria o Canal do Suez tornar-se inseguro ou mesmo intransitável.
A pergunta, inteira, está aí: para onde navegamos e quem é o comandante desta nau chamada Europa, num tempo de águas tão revoltas?