O Chega tinha percebido as portagens há muito
1. Há uma opção muito simples a fazer no Parlamento: ou o Chega se torna na voz reivindicativa do interior do país, ou os outros partidos acordam e olham para esse eleitorado com alguma atenção. Foi o que fez o PS e a esquerda, e, repare-se, foi também o que em certo sentido fez a tecnocrata Iniciativa Liberal. Porque a questão é simples: como vamos estar repetidamente a dizer ao resto do país que “não há dinheiro” enquanto temos colossais investimentos públicos de transportes em execução em Lisboa e Porto? E porque queremos gastar 10 mil milhões num aeroporto que pode ficar a custo zero? Ou porque é a alta velocidade muito importante para ligar o litoral ou ir para Madrid, mas circular no Interior tem um permanente imposto de portagens? E porque não pagam portagens as áreas metropolitanas, exatamente onde o rendimento mais alto se concentra?
Alguma vez as SCUT iriam acabar. E sim, como ontem este jornal publicava: é caro. Mas tudo é caro. Manter as portagens ao longo do país – incluindo esse negócio sibilino que está na agenda, o de prolongar as concessões da Brisa e das outras concessionárias –não só torna as autoestradas menos usadas como incrementa o custo de manutenção e a sinistralidade das estradas nacionais. A despesa, essa, cai sempre no Orçamento de Estado, seja pelas obras, seja nos hospitais.
As “SCUT” – designadas como ‘sem custo para o utilizador’ até José Sócrates as instituir como portagens – começaram por ser, em muitos casos, melhorias de traçado de estradas nacionais ou vias rápidas, ficando muitas delas com perfil próximo de autoestrada. Uma benesse. Exceto quando todas estas regiões ficaram com vias melhoradas, mas com portagens e sem alternativas. Ora, isto não era o combinado. E assim, o descontrolo das contas do tempo Sócrates acabou a ser pago pelas regiões com menos rendimento do país desde 2010.
É igualmente demagógico dizer-se que o fim das portagens estimula o uso do carro próprio. Não nos enganemos: a maior parte destes territórios não tem sistemas de transporte regulares fiáveis. Quem não tem carro, tem dificuldade em chegar sempre a horas ao trabalho, fazer as compras, gerir a vida em família.
A sedução pela vida mais fácil no litoral despovoou o país. Junte-se a isto uma agricultura de pequena dimensão e uma floresta industrial altamente combustível, e perceba-se que, quem ainda lá está, merece o estatuto de ‘guardião do território’. Devia receber por lá viver. Eliminar estas portagens é, afinal, muito barato.
2. O PS deixou a Agricultura em estado de coma, quer pela pouca intensidade na execução dos fundos ‘2020’, quer sobretudo pelo facto de o novo plano de apoios comunitários não ter sequer data de estreia. Mas o novo ministro e ex-deputado europeu, José Manuel Fernandes, parece ter iniciado a tarefa pelo fim – avisos aos “radicalismos verdes”, no seguimento, aliás, das histriónicas frases do cabeça de lista do PSD por Santarém e ex-presidente da CAP, Eduardo Oliveira e Sousa.
Se é verdade que a União Europeia precisa de exigir os mesmos critérios fitossanitários para quem quer vender cá, não é menos importante que continue a afinar a sua bitola pelos mais elevados padrões de conhecimento científico – em vez de desistir deles. Na alimentação nada se define por um consumo único. O cancro é das doenças mais disseminadas em todo o mundo. Por todas as razões, não se torna óbvio que ir diminuindo os pesticidas no campo é obviamente o caminho certo? E a União Europeia, em vez de tornar este processo mais viável, vai chamar-lhe “radicalismo verde”?