O acordo abrangente sobre investimento UE-China
O Conselho e a Comissão da UE concluíram, no final de 2020, um acordo de princípio quanto a um Acordo abrangente sobre Investimento (CAI) com a República Popular da China. Um dos pressupostos subjacentes a este acordo radica na crença de ambas as partes num sistema de comércio multilateral aberto e na reafirmação dos respetivos compromissos no âmbito do Acordo da OMC e de criar um clima que facilite e desenvolva o comércio e o investimento entre as partes, estabelecendo as disposições necessárias para a liberalização do investimento. Outro pressuposto radica nos números - a UE é o primeiro destino das exportações chinesas; a China é o terceiro destino para as exportações da UE (depois dos EUA e do Reino Unido). Entre 2000 e 2020, as empresas da UE investiram cerca de 148 mil milhões de euros na China e as empresas chinesas cerca de 117 mil milhões de euros na UE.
Em termos de fundamentos concretos, o mais importante radica no forte desejo das empresas de ambas as partes de acesso ao mercado da outra parte. Do lado europeu, o crescimento da economia chinesa - que será a maior do mundo em 2050 com um PIB de c. 49 mil milhões de euros - torna incontornável ter acesso tão breve quanto possível ao mercado chinês, em especial ao mercado da China urbana (875 milhões de pessoas em 2020; c. 1000 milhões em 2030). Do lado chinês, cada vez mais empresas desejam ou necessitam de se internacionalizar e o mercado mais apetecível para o efeito é o mercado europeu, atenta a dimensão deste e o rendimento per capita na UE.
Por outro lado, é importante nivelar os termos em que o investimento na outra parte tem lugar, nomeadamente removendo fortes restrições ou limitações - por exemplo, as fortes restrições na China nos setores dos serviços financeiros e das telecomunicações. Por outro lado, este CAI proibirá transferências forçadas de tecnologia e restringirá os termos em que companhias estatais chinesas (SOE) podem funcionar fora das regras normais de um mercado concorrencial.
O timing é propício para este CAI. Do lado europeu, a enorme exposição de grandes empresas europeias na China - sobretudo no setor manufatureiro - reclama uma relação baseada em regras mais equitativas. Por outro lado, os setores de serviços financeiros, de serviços comerciais e de saúde na China revestem-se de particular interesse para as empresas europeias e carecem de maior concorrência no mercado doméstico chinês. Do lado chinês, apesar da perceção de muitos de que o capital chinês é inesgotável, a verdade é que nem para as Novas Rotas da Seda (BRI) o capital disponível chinês é suficiente nem as novas vagas de internacionalização de empresas (médias) chinesas podem contar com ele (pelo contrário, deverá ser baseada em OPI na Europa). Pelo que é importante para a China criar condições para um constante fluxo de IDE no país. Por outro lado, as sucessivas listas negras de empresas chinesas formuladas pelas autoridades dos EUA não vão diminuir; pelo contrário, a administração Biden não abrandará a política anterior neste domínio, que forçará muitas empresas chinesas - sobretudo estatais e tecnológicas, mas não só - a sair do mercado norte-americano e a procurar novos mercados com similar nível de rendimento, capital e tecnologia. Portugal pode, e deve, posicionar-se para esta nova vaga de investimento chinês na Europa.
Consultor financeiro e business developer
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