Novos interlocutores na Justiça portuguesa
Com a recente renovação dos órgãos da Ordem dos Advogados, abre-se um novo ciclo de expectativas legítimas quanto ao papel institucional da Advocacia na construção de políticas públicas para o setor da justiça. A nova configuração das lideranças na Ordem, permite conjeturar uma atuação mais coesa, estratégica e assertiva junto do Ministério da Justiça e da Assembleia da República, visando a defesa do Estado de Direito, a promoção da dignidade da Profissão e a valorização do exercício da Advocacia como função essencial à administração da justiça. O contexto atual exige mais do que diagnósticos – há muito feitos –, soluções reais e exequíveis. A Ordem dos Advogados precisa de deixar de ser percecionada como uma associação reativa e reivindicativa, fragmentada e absorvida em querelas internas, para assumir um papel proativo, de credibilidade institucional, orientada para a construção de consensos e para a apresentação de propostas sólidas e exequíveis, com impacto direto na eficiência da justiça e na proteção dos direitos dos cidadãos.
A aproximação à realidade dos Advogados no seu quotidiano, com especial atenção às dificuldades sentidas na prestação de serviços de consultoria especializada, no exercício do mandato judicial, nos serviços prestados no sistema de acesso ao direito (SADT) e na adaptação às novas exigências tecnológicas, constituem eixos fundamentais de atuação da Ordem dos Advogados. Por outro lado, espera-se uma disciplina transparente, célere e previsível, ancorada num modelo de justiça interna isento, respeitador dos princípios fundamentais do contraditório e da imparcialidade, limitando a justiça disciplinar àquelas situações que verdadeiramente o justifiquem, valorizando e independência e a liberdade da Profissão, sem perseguições internas ou externas. A independência da Advocacia constrói-se também na exigência ética e na autorregulação eficaz; mas, a ética exigível a estes Profissionais, tem necessariamente de ser ancorada nas prerrogativas e necessárias imunidades que todos os agentes da justiça lhes devem reconhecer e garantir, permitindo reforçar a confiança pública na Profissão como garante do exercício dos legítimos direitos e interesses dos cidadãos e das empresas num Estado de Direito democrático.
A par de tudo o que ficou dito, assume-se como inevitável o investimento sério na modernização tecnológica da Associação e da Profissão. A Ordem e a Advocacia não podem continuar a ser um setor avesso à transição digital. A inteligência artificial e as plataformas digitais representam ferramentas de produtividade e eficiência incontornáveis e que constituem um mecanismo para um melhor acesso ao direito e à justiça. A Ordem deve liderar a revolução tecnológica na Profissão, capacitando os seus membros e estabelecendo padrões de qualidade e de segurança na utilização das novas tecnologias. No plano externo, é essencial que a Ordem recupere o seu papel de interlocutor qualificado e respeitado nas reformas legislativas e nos processos de reorganização judiciária. A relação com os decisores políticos deve ser de base construtiva e não reivindicativa, apresentando soluções para problemas conhecidos e colaborando na sua implementação, o que passará necessariamente pela dignificação do papel da Advocacia em todas as suas áreas de intervenção, seja na prestação de serviços de consultoria especializada, no exercício do mandato forense ou na prestação de serviços ao Estado no âmbito do SADT.
Fazemos, pois votos, que os novos órgãos saídos da recente eleição, consigam abrir caminho para uma Advocacia mais forte, mais respeitada e mais presente nas decisões que moldam o futuro da justiça em Portugal.
Advogado e sócio fundador da ATMJ - Sociedade de Advogados