NATO, sempre!
Em 1949, ano de formação da NATO, o comunismo era uma ameaça para o mundo. Fazia parte da ideologia e do sistema o empenho na expansão global do paraíso socialista na terra, para a qual os dirigentes de Moscovo contavam, em cada país, com os partidos comunistas. E a NATO, de que o regime autoritário e iliberal português fazia parte desde a fundação, nascia como a organização político-militar destinada a combater o “perigo vermelho”.
No Natal de 1991, em consequência das políticas agressivas de Reagan e do bluff da Guerra das Estrelas, da colaboração da monarquia absoluta saudita na baixa do preço do petróleo, da personalidade pouco “tirânica” de Gorbachev e da cumplicidade de Pequim, a União Soviética caiu. E com ela o perigo que representava para o “Mundo Livre”.
Vencido o inimigo - a URSS e o Pacto de Varsóvia -, a NATO devia ter-se dissolvido; ou, pelo menos, ter-se reconstituído. Mas, como então disse Alan Clark, ministro da Defesa de Margaret Thatcher (reparo que lhe custaria o lugar), havia uma burocracia de uns milhares de funcionários bem pagos, civis e militares; havia estruturas, quartéis, funções, empregos.
Na NATO ia dar-se um processo pelo qual outras instituições e burocracias já tinham passado: desaparecido o perigo que lhes dera origem, anulada a sua razão de ser estatutária, viera a adaptação e a procura de novos fins e pretextos para manter a estrutura a funcionar.
Na falta do inimigo soviético, passou-se ao perigo islâmico, fazendo coincidir, por comodidade, o Islão com o jihadismo - como se o jihadismo não matasse mais muçulmanos no Paquistão ou na Indonésia do que cristãos no Ocidente; e como se as guerras dos neoconservadores que levaram à invasão do Iraque, fazendo crer que Saddam ajudava os terroristas e tinha armas de destruição maciça, não tivessem sido responsáveis pelo massacre de muitos dos milenares cristãos do Oriente.
Depois, a 5 de Novembro de 2024, deu-se o que muitos analistas - da América, da Europa e particularmente aqui do rectângulo - consideravam impossível: a eleição de Donald Trump. Diziam-nos que, se Trump era mau e as eleições boas, Trump não podia ganhar eleições; que a Ucrânia estava a ganhar a guerra; e que Joe Biden estava em excelente forma (a desinformação que o mostrava menos bem era ditada por discurso de ódio e feita de imagens manipuladas e disseminadas nas redes sociais pela “extrema-direita”).
Agora, com “um novo sheriff em Washington” a conversar com Moscovo, “os europeus” parecem ter acordado.
Macron anda num vaivém, cruzando o Atlântico para aplicar ao “querido Donald” o seu “extenso repertório de elogios, incluindo linguagem corporal de proximidade e infindáveis apertos de mão” (para usar as palavras de Stephen Collinson, da CNN), a fim de, falando pela Europa (já que “a Europa” não fala), lutar por um lugar na mesa das negociações e pedir back-up americano para as tropas europeias que, na Ucrânia, possam depois garantir a paz. Outros, falam em seguir, por uma vez, o conselho do Presidente americano e passar a gastar 5% com a Defesa - não pensando nos trunfos que estarão a dar à “extrema-direita” que, a ser assim, não falhará uma eleição europeia até 2030.
Finalmente, outros ainda, os mais sábios (agora, pelo menos), dizem ter agora percebido que a Europa só está a pagar o preço de uma visão utópica da política e da geopolítica que a fez acreditar numa ordem liberal internacional que não tinha força para impor. E se não a tinha com a América, muito menos a terá contra a América. Com NATO ou sem NATO.
Politólogo e escritor
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia