Nas costas dos outros vejo as minhas

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O ano de 2016 ficou na memória coletiva dos países que compõem as mais importantes organizações internacionais de que Portugal é membro: nas organizações multilaterais assistimos, com (generalizada) surpresa, à tomada de posse do presidente Donald Trump; e vimos, com (absoluta) incredulidade o Reino Unido a decidir abandonar a União Europeia.

E embora as mudanças em Washington e Londres representassem os choques mais visíveis das democracias Ocidentais, não eram as únicas, já que os Governos da Polónia, da Hungria e da Grécia já tinham partidos populistas na sua composição e a Frente Nacional Francesa e a Alternativa para a Alemanha estavam, como estão hoje, em franco crescimento eleitoral.

Face aos resultados das eleições e referendos, cientistas políticos lançaram-se na procura de explicações que permitissem compreender o que tinha acontecido em algumas das mais importantes democracias dos dois lados do Atlântico, tendo surgido uma tese que permitiu lançar alguma luz sobre os resultados de Trump nos Estados Unidos, da dupla Farage/Johnson no Reino Unido e (com as devidas diferenças) de Le Pen na França: as pessoas que tinham optado pelas soluções simplistas e aparentemente fáceis dos populistas eram as mesmas que tinham maiores dificuldades em lidar com a globalização da economia, nomeadamente com a relocalização dos empregos para países onde os salários eram mais baixos e com a abertura dos seus mercados de trabalho a imigrantes que custavam menos para executar as mesmas funções.

Ou seja, as pessoas que sofriam o impacto económico e social da integração da economia mundial voltaram-se para quem lhe prometeu resolver as suas aflições rapidamente e sem qualquer dificuldade.

Esta explicação económica e social foi posta em causa com a chegada de partidos populistas aos Governos de democracias nórdicas ou da Europa do Norte, onde os sistemas de Segurança Social são reconhecidamente eficazes e protegem as pessoas que deles necessitem.

Mas se não são questões económicas e sociais, qual é o apelo dos populistas? A outra explicação é mais preocupante: o populismo apela e promove discriminação de identidade, onde os “nós” são sempre melhores que os “eles”. Como se fosse possível que todas as pessoas que vêm de fora sejam piores que todas as pessoas que são de cá… É obvio que não há monopólios nacionais de virtudes!

Em Portugal, as narrativas nativistas são ainda mais ofensivas. Poucas serão as pessoas que não conheçam alguém que emigrou para outro país. E é a nossa diáspora que terá língua, hábitos e cultura diferentes dos países para onde foram construir o seu futuro. Nas costas dos “eles” que vieram para Portugal deveríamos ver os nossos “nós” que foram para outras paragens…

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