Níger 'versus' Orano e o desmantelar da “África Ocidental Francesa”!

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O programa nuclear francês foi sempre central na “feitoria” que a França conseguiu consolidar na África Ocidental e no Sahel, após as independências, do Senegal ao Chade, do Mediterrâneo ao Golfo da Guiné! Controlar este “presunto de terra entremeada” entre o árido e o tropical, obedeceu a um plano, que mais não foi prolongar a presença comercial dos franceses após a saída dos políticos, através da manutenção do instrumento-chave que controla qualquer economia, uma moeda única, o Franco CFA, criado em 1945. Da data da criação até agora, as saídas e adesões a este “banco central”, reforçam o “elástico das bandas largas” criadas para garantirem a perenidade das dependências.

Enquanto assistimos na passada semana Cabo-Verde a celebrar 50 anos de independência e de bem com Portugal, a “África Ocidental Francesa” celebra 65 anos, mas em mágoa, sendo a realidade Orano, no Níger, um dos desafios deste fim de quartel de século para um novo pan-africanismo, renascido em 2024 em Dakar!

Por partes, em 2013, aquando da morte de Kaddafi e do colapso da Jamahiriya Líbia, o regresso das milícias tuaregues ao Mali, Burquina e Níger, preocupou fortemente a França, pela desestabilização que mais uma vaga de reivindicações independentistas tuaregues, trariam à gestão da “feitoria”. Essa reivindicação surgiu essencialmente no Azawad maliano, o norte tuaregue finalmente a vislumbrar nova oportunidade. Não surgiu no Níger, porque os potenciais reivindicadores foram absorvidos pela então Areva, agora Orano!

Quando o presidente François Hollande carregou no botão em janeiro de 2013 e deu início à Operação Serval, a justificação era clara, a pornografia jihadista já tinha atingido a cidade de Konna. E, como sabem, de Konna a Bamako é um tirinho e a virtude islâmica não a podia possuir!

Na leitura mais profunda, a partir de dentro, esta foi logo baptizada como “a guerra da Areva”, já que os franceses sabiam que o que se seguia seria uma greve geral nessa exploração de urânio, fundamental para o programa nuclear francês e possíveis reivindicações para a sua nacionalização.

Não foi em 2013, foi em junho de 2025! No final do mês, o Conselho de Ministros da nova Junta Militar, aprovou decreto para a nacionalização dos 63% da Orano, em Arlit.

A França depende em 80% deste urânio, pelo que esta decisão do “novo Níger”, parte da Aliança dos Estados do Sahel com Mali e Burquina Faso, anuncia os passos seguintes e que marcam em definitivo, o desmantelar da “África Ocidental Francesa”. Acabando com a moeda única, “derrete-se o cimento” que tem colado a CEDEAO, a “CEE da África Ocidental”!

Politólogo/arabista

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Escreve de acordo com a antiga ortografia

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