“Mais vale madrugar do que perder um tempo histórico”
Falar em investimento na Defesa Nacional exige alguma cautela por parte de quem usa essa expressão. Quando se fala em reforçar esse “investimento” para dois ou 3% do PIB convém ter em conta qual é o real ponto de partida. O que é, de facto, investimento - aquisição de novos produtos, investigação e desenvolvimento - e o que são despesas correntes. Portugal ainda está no muito pequeno conjunto de países (apenas seis em 31) que ainda não atingiu a meta dos 2% do PIB, em relação à qual se comprometeu com a NATO há 10 anos.
O governo PS tinha estabelecido 2030 como meta e o governo AD antecipou para 2029, mas é bem provável que o consiga antes. No ano passado, a previsão de 1,55% foi ultrapassada para 1,58% do PIB nos gastos, um total de 4,5 mil milhões. Decompondo o valor, porém, verifica-se que 31% não são despendidos diretamente para os serviços sob tutela do Ministério da Defesa Nacional (MDN), como é o caso das Forças Armadas. Uma parcela substancial foi transferências para a GNR (253 milhões), uma força de segurança que, em caso de guerra, fica na dependência do MDN; para o Fundo Comum da NATO, do Ministério dos Negócios Estrangeiros (26,5 milhões); para a Caixa Geral de Aposentações, do Ministério das Finanças (974 milhões), para os Serviços e Fundos Autónomos, como o Instituto de Apoio Social das Forças Armadas, e para Entidades Públicas Reclassificadas , como o Arsenal do Alfeite.
Quanto aos pouco mais de três mil milhões que ficam, tendo em conta a estimativa publicada no último relatório da NATO, 58,6% desta verba é para pagar aos recursos humanos, percentagem só superada pela Itália, com 59,4%. Para operações e manutenção são atribuídos 17,9% do bolo total e só seis países da NATO gastam uma percentagem menor.
Quando ao investimento propriamente dito, no qual se inclui a aquisição de equipamento (incluindo a investigação e desenvolvimento) Portugal gasta 19,5%, já muito perto da meta de 20% que a NATO pede. Verdade se diga que é mais do dobro do que era há 10 anos, em 2014. No entanto, só a Bélgica e a Bulgária apresentam uma percentagem inferior de investimentos.
Há ainda, portanto, um longo caminho a percorrer, no qual é preciso fazer escolhas. Se na próxima Cimeira da NATO em Haia, prevista para 24 a 25 de junho, for decidido subir as despesas para 3% do PIB, estamos a falar, no caso português, para um valor na casa do oito mil milhões de euros. Ora, a título comparativo, a despesa prevista para a Educação em 2025 é de 7,4 mil milhões de euros, a da Saúde 17 mil milhões e a da Segurança Interna pouco mais de 3 mil milhões.
Ou seja, tudo o que for direcionado para a Defesa deve ser muito bem ponderado, explicado e compreendido pela população. Só dessa forma se legitima o poder. Sabemos que, pelo menos, os maiores partidos, PSD, PS e Chega, estão bastante alinhados na necessidade de sacrificar o menos possível as despesas sociais. Mas será necessário mais do que isso. Como escreveu aqui no DN João Annes, do Observatório de Segurança e Defesa da SEDES, “o aumento das metas da NATO para os investimentos em Defesa deve ser um elemento adicional de estímulo para Portugal empreender a necessária transformação das Forças Armadas, não por uma questão de obrigação internacional, mas por uma necessidade existencial, para assegurar que o país está preparado para defender os seus interesses na arena geopolítica. E, também, porque investir na Defesa não é apenas uma questão militar, mas um investimento no futuro do país”. Aproveito a citação do Presidente da República, que relembrou: “Mais vale madrugar do que perder um tempo histórico” (Seminário “Desafios para a Segurança e Defesa Nacional”, do GREI em 2023). Não devemos, nem podemos, perder oportunidades como apostar cada vez mais nas novas tecnologias para as Forças Armadas e reforçar a indústria nacional, visando, muito mais do que a Defesa, o desenvolvimento económico.