Mais uma voltinha, os jovens pagam e não andam

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Foi antecipado em agosto pelo primeiro-ministro e pelos vistos será uma realidade no próximo Orçamento do Estado para 2022: o alargamento de três para cinco anos da medida IRS Jovem.

Vamos por partes. Contextualizando: a medida IRS Jovem consiste em atribuir aos jovens entre os 18 e os 26 anos, com qualificações ao nível do ensino superior ou secundário, nos primeiros três anos de trabalho dependente, um desconto em sede de IRS.

Mas, como sempre, o governo está atrasado. No passado ano de 2020, no âmbito da discussão do Orçamento do Estado para 2021, eu própria subscrevi em conjunto com outros colegas mais novos da bancada do PSD uma proposta de alteração que previa não só o alargamento de três para cinco anos da aplicação da medida, mas também a inclusão do trabalho independente como parte da equação. E não poderia deixar de ser, tendo em conta a quantidade de jovens neste país que só conseguem trabalho a recibos verdes.

Na altura, o PS votou contra a nossa proposta de alteração ao OE e na próxima segunda-feira apresentá-la-á, sem qualquer pejo, como sendo uma grande inovação socialista. Mas, autorias à parte, isto leva-nos para outra questão: não devíamos já estar noutro patamar?

Se hoje existe precariedade laboral, baixos salários e se continuamos sem conseguir reter os jovens que tanto nos custaram a formar, o alargamento da medida IRS Jovem está longe de resolver o problema. É um mero paliativo quando enquadrado com os três enormes desafios que Portugal enfrenta com as novas gerações: a emancipação, a natalidade e a solidariedade intergeracional.

Para a maior parte dos jovens portugueses, sair de casa dos pais é uma realidade bem longínqua. Deixam a casa dos pais três anos mais tarde do que a média europeia, aos 29.

Ter filhos é uma absoluta miragem. E não me convençam de que é por comodismo. A natalidade em Portugal é um problema de condição de vida, de economia e melhoria do emprego, e antes de mais devem ser estes os pressupostos a considerar nesse debate.

Enquanto isso, veremos estourar nas mãos da minha geração uma bomba-relógio nas próximas décadas. Daqui a 20 anos, quem se reformar não irá receber nem sequer metade do seu último salário. Pior, estima-se que a partir de 2035 haverá uma redução dramática dos trabalhadores que fazem descontos. A população em idade de trabalhar, dos 20 aos 64 anos, vai encolher em quase 2 milhões de pessoas. Prevê-se ainda que os pensionistas portugueses passarão a receber reformas no valor de menos de metade dos seus salários antes da década de 2050 e ficarão 20 anos mais tarde a receber apenas 41,4% dos rendimentos que tinham antes da reforma.

Repare: ainda que fazendo parte da população ativa em 2040 e nos 20 anos seguintes, a minha geração conviverá, naquelas décadas, com uma outra geração de reformados que terá de viver com menos de metade do seu último salário. Pergunto-me como será o cenário quando chegar a nossa vez de descansar.

Ainda sobre o OE de 2022, Costa veio vangloriar-se de que vai dar muita atenção às classes médias e em particular às novas gerações. Sublinhou ainda que vai ser "muito amigo das novas gerações" e vai responder às "necessidades do imediato".

Voltando à medida do IRS Jovem, contas feitas, qual é o verdadeiro impacto que este desconto tem na vida dos jovens que por ela serão abrangidos? Num rendimento mensal de mil euros ao fim de cinco anos o trabalhador conseguirá uma poupança de pouco mais de 2 mil euros. Dá uma média mensal de quase 30 euros. Miserável quando confrontamos com os três grandes desafios que acima aduzi.

Por estes dias, para facilitar a saída de casa dos pais e a sua emancipação, o governo espanhol anunciou a criação de um abono mensal de 250 euros para jovens entre 18 e 35 anos com rendimentos inferiores a 23.725 euros anuais. Porque não fazemos este debate?

Por outro lado, no próximo OE para 2022 adivinha-se um vazio de propostas fiscais para as empresas. Ora, se a iniciativa privada sobrevive assoberbada por impostos e por um Estado explorador, como podem ousar oferecer melhores salários e condições de trabalho mais favoráveis aos seus colaboradores?

Uma coisa é falar de salários líquidos, outra é saber quanto é que custa à empresa o salário que paga ao trabalhador. O valor que é encaminhado para impostos e contribuições sociais é absolutamente pornográfico.

O que seria se, ao invés de ser o empregador a reter este dinheiro e a entregá-lo ao Estado, fosse o trabalhador a entregá-lo, mês após mês, na repartição de finanças mais uma próxima?

Talvez ganhássemos mais consciência da desproporcionalidade que existe entre aquilo que o trabalhador aufere e a parte do seu esforço que sustenta o Estado e este estado de coisas.

Deputada do PSD

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