Lula perde outra primária

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Já se sabia que Lula da Silva torcia por Kamala Harris contra Donald Trump. Mas em vez de fazer claque em casa, no conforto do lar, em frente à televisão, como fazem os adeptos discretos e moderados, o presidente do Brasil resolveu, à última hora, ir para a bancada, com t-shirt, cachecol e até as barbas pintadas de azul democrata.  

“Acho que Kamala ganhar as eleições é muito mais seguro para fortalecermos a democracia dos Estados Unidos. Nós vimos o que foi o presidente Trump no final do mandato, fazendo aquele ataque contra o Capitólio, uma coisa impensável de acontecer nos Estados Unidos, que se apresentava ao mundo como modelo de democracia, agora temos o ódio destilado todo o santo dia, as mentiras, não apenas nos Estados Unidos, mas também na Europa, na América Latina, em vários países do mundo”, disse à francesa TF1.

E para rematar: “É o fascismo e o nazismo voltando a funcionar com outra cara. Como sou amante da democracia, que acho a coisa mais sagrada que nós humanos conseguimos construir para bem governar, obviamente estou torcendo para a Kamala ganhar as eleições”.

O resultado já se sabe: depois das municipais, onde a direita que chantageia o governo – chamada de “direita pragmática” – saiu vencedora e a direita bolsonarista – chamada de “direita psiquiátrica” – ficou em segundo, atirando a esquerda para o terceiro, para não dizer último lugar eleitoral, nova derrota do presidente, do PT e dos progressistas, desta vez não no Brasil real mas nos EUA reais, a dois anos da presidencial brasileira.

Não há volta a dar: o povão agora é de direita, cá e lá, e suscetível aos discursos dos mais medíocres líderes desse campo, cá e lá.

E qual o impacto das eleições nos EUA, maior PIB, de longe, do continente americano, no Brasil, segundo maior PIB, à frente de Canadá, México, Argentina e Colômbia, do continente americano?

O governo, via ministro das Relações Institucionais, relativizou-o. “Acho que [a eleição americana] vai ter um impacto mais na animação de alguns seguidores de um lado e do outro. Mas, em relação aos impactos da cooperação que nós venhamos a fazer, estamos cada vez menos dependentes dos Estados Unidos”, disse Alexandre Padilha ao jornal Metrópoles.

“Se o Trump quiser fazer algum tipo de retaliação, sinceramente, quem está perdendo é ele, porque vai estar perdendo um parceiro importante, que é o Brasil, mas não tem sido essa a tradição dos governos republicanos, aliás, que sabem a importância do Brasil”, concluiu.

Mesmo que Kamala tivesse ganho, os governos brasileiro e norte-americano continuariam a divergir sobre a aproximação de Brasília a Pequim e sobre as guerras na Ucrânia e em Gaza. Com Trump, além desses três pontos, haverá clivagens nas áreas dos direitos humanos e, sobretudo, do meio ambiente, a um ano da COP30, em Belém, do Pará.

Mas, de resto, é sobretudo na política doméstica que o regresso ao poder do republicano tem reflexos, como alertou Padilha. O deputado federal Eduardo Bolsonaro já fez questão de se fotografar, deslumbrado, em Mar-a-Lago a acompanhar a votação. E Jair Bolsonaro publicou, logo após a entrevista de Lula pro-Kamala, um vídeo a dizer que apoiava Trump.

Horas depois da eleição, aliás, o inelegível ex-presidente lembrou essa mensagem e agradeceu a Deus pela vitória do ídolo. Como se Ele e ele tivessem tido alguma coisa a ver com isso.     


* Em São Paulo

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