Lobby lusófono no Conclave?

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Portugal desempenhou um papel de grande importância na História do catolicismo, basta pensar que o país hoje com maior número de católicos é o Brasil e que aquele percentualmente mais católico é Timor-Leste. Some-se a isto, se ainda houver dúvidas, que metade dos 30 milhões de cristãos da Índia são católicos e muitos têm nomes de família como Fernandes, Dias, Pinto, D’Silva ou D’Souza ou sublinhe-se o uso do português na liturgia dos “cristãos ocultos” japoneses. A par dos espanhóis, foram os portugueses os grandes responsáveis pela expansão global da influência dos papas, e isto num momento em que na Europa Ocidental o seu tradicional domínio era desafiado pelas teses de Lutero.

Apesar desta ligação estreita entre Portugal e a Santa Sé, apenas houve um português como chefe da Igreja Católica em dois mil anos, conhecido como Pedro Hispano e que ficou na História da Igreja como João XXI. E curiosamente aconteceu no século XIII, muito antes de as caravelas portuguesas partirem “em busca de cristãos e de especiarias”, frase que ficou associada à chegada de Vasco da Gama à Índia. Mas poucos são os países que podem reclamar grande número de papas, pois a esmagadora maioria são italianos, mais de 200. A seguir vem a França com menos de 20. A Espanha, por exemplo, teve dois papas. A variedade de origens nacionais das últimas décadas, com um papa argentino a suceder a um papa alemão que por sua vez sucedeu a um papa polaco, só pode ser entendido como um sinal dos tempos, e é bem possível que se venha a acrescentar nova nacionalidade, pois a diversidade dos membros do próximo Conclave é tremenda, um dos legados de Francisco.

Nessa diversidade do Conclave, Itália continua a destacar-se pelo número, 17 cardeais eleitores. Os Estados Unidos têm 10, o Brasil sete, Espanha e França cinco cada. Seguem-se vários países com quatro cardeais eleitores, entre eles a Polónia, também a Argentina e igualmente Portugal. Nenhum dos portugueses surge entre os nomes dados como papáveis, mas mais importante do que o peso relativo do pequeno grupo de cardeais nascidos em Portugal é a existência de um significativo grupo de lusófonos, 13 ao todo. Os tais sete brasileiros e os quatro portugueses, mais o cardeal cabo-verdiano e o timorense. E há um 14.º cardeal que fala português, o indiano D. Filipe Neri, arcebispo de Goa e Damão, que nasceu ainda na época colonial e cujo nome de família é Ferrão.

Se emergirá ou não um lobby lusófono na eleição do novo papa ninguém pode dizer. E se o segredo for respeitado, como é suposto, provavelmente nunca se saberá. Mas quem já leu sobre anteriores conclaves, ou viu o filme Conclave, percebe como as conversas de bastidores têm importância e não poderá deixar de perguntar se estas 13 ou 14 vozes não pesarão na decisão, seja ela qual for. Afinal representam cerca de 10% dos votos e vêm de quatro continentes, o que é suposto valer muito numa Igreja Católica pós-Francisco que se pretende universal.

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