John Warner (1927-2021). O sexto marido de Elizabeth Taylor
O nome poderá, a princípio, não soar quaisquer campainhas na memória de um leitor português. John Warner foi um político de impacto nacional, nos Estados Unidos, mas não alcançou funções executivas nem cultivou ambições presidenciais que o fizessem chegar a ouvidos ibéricos. O mais próximo que se aproximou de nós, em horizontes de celebridade, terá sido pelo seu casamento de seis anos com a sim famosíssima atriz Elizabeth Taylor, de quem foi um dos sete honoráveis maridos. O penúltimo, para ser mais preciso, de 1976 a 1982, com manifesto sucesso mediático para ambos. Mas John Warner, o segundo senador do seu estado natal que mais tempo exerceu o cargo (30 anos), nunca deixou de ser um homem da sua terra e da sua vocação: a Virgínia e as Forças Armadas.
Desaparecido nesta semana, há três dias, John William Warner, o III, faleceu de ataque cardíaco na sua casa, aos 94 anos de idade. Cresceu e fez vida em Washington, DC, e deu o seu último sopro no estado que sempre o elegeu. Alistou-se em plena Segunda Guerra Mundial antes de atingir a maioridade, falsificando a data de nascimento, e serviu como fuzileiro na Guerra da Coreia. Estudou e licenciou-se em Direito, estagiando como secretário no tribunal nacional de recursos. Em 1956, tornar-se-ia procurador-geral adjunto do mesmo. Depois, enveredaria pelo setor privado até entrar na política ativa, pelo Partido Republicano, a convite de Richard Nixon, de quem foi assessor de campanha, subsecretário de Estado e ministro da Marinha.
Com Ford, que sucedeu a Nixon após o Watergate, foi parte preponderante nas negociações em torno de assuntos navais com a União Soviética. O vice-presidente feito presidente afeiçoar-se-ia à operacionalidade e independência de Warren, indicando-o para responsável máximo pelas comemorações do bicentenário dos Estados Unidos da América, em 1976, eventualmente o cargo mais significativo que desempenharia na vida pública.
Quando eleito senador pela primeira vez, em 1978, os seus comícios atrairiam multidões devido à presença de Elizabeth Taylor, que acabaria por deixá-lo, "não resistindo à solidão" imposta pelos deveres políticos do marido. Ficariam, todavia, amigos, de acordo com a própria. Perderia as primárias, antes de perder Taylor, mas um desastre de aviação meses depois faria que o lugar no Senado se tornasse seu. Lá ficaria por 30 anos, sempre ligado aos comités de Defesa, e tendo trabalhado de perto com Joe Biden, outro veterano senatorial, que lhe prestou agora homenagem como inquilino da Casa Branca. "Os seus princípios eram guiados por dois vetores: a sua consciência e a nossa Constituição, sem desvios de consciência ou receio de consequências."
E, na sua carreira como republicano, foi de facto assim. Em matérias de direitos das mulheres, restrições ao porte de arma, condenação de práticas de tortura, nomeações para o Supremo Tribunal e reformas ecologicamente conscientes, John Warren nunca teve medo de enfrentar o establishment do GOP, inclusivamente durante a tão polarizada era do primeiro mandato de Obama. Em 1994, quando os republicanos tentavam ripostar contra o sucesso de Bill Clinton, não hesitaria em preferir o apoio a um candidato independente, oferecendo uma vitória aos democratas do seu círculo. Oliver North, o seu colega conservador, havia sido acusado de mentir ao Senado.
Mark Warren, seu homónimo de sobrenome e que lhe sucederia em 2008, disputou uma eleição com ele 12 anos antes e a coincidência de ambos se chamarem Warren provocaria confusão e humor. "Mark, not John", era um dos slogans do democrata, o que levou um dos seus constituintes a presumir que o cartaz se referia aos apóstolos da Bíblia e não aos candidatos à câmara alta norte-americana. Na dúzia de anos que dividiu a disputa da sucessão, ficariam amigos, apesar das divergências partidárias. Warren (Mark, não John) seria um dos senadores a prestar-lhe homenagem nesta semana. "Na Virgínia, esperamos que os nossos representantes lutem por aquilo em que acreditam, sem cair no ataque pessoal. John Warner simbolizava tudo isso. E precisamos de mais exemplos como ele".
Não só na América, não é verdade?
Colunista