Itália e Portugal: datas e traços de uma identidade partilhada
25 de Abril é um dia muito importante. Uma data que une os portugueses e os italianos porque a Revolução dos Cravos de 1974 e a proclamação da insurreição geral contra o Fascismo em 1945, ambas tendo ocorrido a 25 de Abril, trouxeram resultados semelhantes, cujo valor é hoje indiscutível tanto para os italianos, quanto para os portugueses. Democracia, liberdade de pensamento, de opinião, de imprensa e de expressão. Igualdade entre os povos, descolonização; igualdade entre as pessoas, entre os sexos, com o inestimável corolário do direito de voto para as mulheres. Em breve, o dia 25 de Abril se tornou uma janela que nós abrimos para nos debruçarmos sobre o mundo livre de hoje.
Tocou-me a honra de chegar como embaixador a Lisboa justamente poucos dias antes deste aniversário histórico e de ter a oportunidade de participar nestas imponentes celebrações que foram organizadas. Porém, este não é o único grande aniversário ao qual terei o prazer de assistir durante o meu mandato: também em 2024 se assinalam os 500 anos do nascimento do grande Luís de Camões, pai da literatura e talvez até da língua portuguesa, “última flor do Lácio inculta e bela”. É Olavo Bilac quem nos recorda as origens latinas comuns do italiano e do português, outro elemento cultural que o povo italiano compartilha com todos aqueles povos que falam português. Povos hoje unidos na CPLP, na qual a Itália se orgulha do seu status: o de País Observador, graças inclusive a mais de 600.000 dos seus cidadãos que são lusófonos nativos.
O poema de Camões também evoca em mim o odor, a imagem e o som do mar, mais um elemento enraizado nas nossas culturas: o Atlântico para os portugueses, o Mediterrâneo para os italianos, berços de Civilização e de História marítima. A História é uma coisa importante, para nós italianos, e para nós portugueses. O que aconteceu há mil anos, há 500 anos, ainda hoje determina e orienta nossas vidas e nossas convicções.
Em 1524, enquanto Camões nascia, o Senado da República de Veneza autorizou Antonio Pigafetta a publicar o seu Primeira viagem ao redor do globo terrestre, no qual relatava a viagem realizada nos anos anteriores com o Capitão Magalhães, elevando assim o grande explorador português à glória das crónicas e da história oficial, a dos documentos escritos. E há mais: 300 anos antes daquela viagem, outro António havia partido de Lisboa rumo à Itália, a convite de um já famoso Francesco. Hoje os dois são respetivamente o santo padroeiro de Portugal e o santo padroeiro de Itália.
Lá estão os dois gigantes a lembrar-nos que a cultura católica também é um dos pilares do edifício de valores que temos em comum. Desde aqueles tempos os franciscanos saúdam dizendo “paz e bem” e os seus descendentes, italianos e portugueses de após o 25 de Abril, aceitaram em pleno esse legado de amor e paz no mundo ao carregarem juntos um ramo de oliveira lá onde for preciso.
Aquele ramo de paz também é a base da nossa alimentação: não faz diferença que comamos massa ou peixe, afinal o que sobra nos nossos pratos após uma boa refeição é um fio de azeite da azeitona, a realçar que nossas raízes comuns assentam profundamente no que abrange a nutrição, os sabores, os produtos de nossos territórios e de nossos mares. A unir-nos na dieta mediterrânica, reconhecida pela UNESCO como um património que os países do sul da Europa colocaram à disposição da Humanidade inteira.
Será que podem existir dois povos diferentes que tenham maisem comum do que os portugueses e os italianos têm?