Israel e a Palestina: duas histórias, um mesmo direito à dignidade

Publicado a

A história dos povos de Israel e da Palestina é longa, complexa e marcada por sobreposições de memórias e reivindicações. São trajetórias distintas que se cruzam no mesmo território e no mesmo desejo de viver em paz e com dignidade.

O povo judeu carrega uma memória milenar, enraizada na antiga terra de Israel e na herança cultural e religiosa que dali se expandiu. Ao longo dos séculos, conheceu prosperidade e dispersão forçada. E conheceu o Holocausto, no qual seis milhões de judeus foram assassinados, que marcou profundamente a identidade coletiva judaica e reforçou a certeza da necessária de uma pátria segura, concretizada com a criação do Estado de Israel, em 1948.

O povo palestiniano, por seu lado, construiu a sua identidade ao longo de séculos de presença contínua na região. A partilha do território no pós-guerra originou deslocações massivas – a Nakba, ou “catástrofe” – que transformaram centenas de milhares de pessoas em refugiadas.

Desde então, a perda de terras, a fragmentação territorial, a ausência de um Estado soberano e o esquecimento do mundo alimentaram um sentimento persistente de injustiça e resistência.

Nos anos 1990, num contexto internacional marcado pelo fim da Guerra Fria e por um multilateralismo mais ativo, os Acordos de Oslo representaram uma viragem histórica. As instituições multilaterais e a diplomacia norueguesa criaram um ambiente favorável ao diálogo, apoiando iniciativas de mediação e programas de reconstrução económica e institucional. Após negociações secretas, mediadas pela Noruega e com apoio dos Estados Unidos, Yitzhak Rabin e Yasser Arafat reconheceram a legitimidade nacional um do outro.

Assinados em 1993 e 1995, os Acordos de Oslo previam a criação de uma Autoridade Palestiniana com competências limitadas na Cisjordânia e em Gaza, a retirada faseada das forças israelitas e um calendário de cinco anos para negociar questões centrais – Jerusalém, fronteiras, colonatos, segurança e refugiados. O segundo acordo aprofundou o processo ao definir diferentes níveis de controlo na Cisjordânia e prever eleições palestinianas. Apesar das limitações, foi o primeiro quadro político formal a reconhecer direitos nacionais a ambos os lados.

O célebre aperto de mão entre os dois líderes, em Washington, simbolizou a possibilidade de dois povos e dois Estados coexistirem lado a lado. Porém, o assassinato de Rabin, em novembro de 1995, por um extremista israelita, foi um golpe profundo, seguido de atentados, respostas militares e da erosão da confiança. Oslo não sobreviveu, mas deixou a certeza de que, quando existe boa vontade e um verdadeiro desejo de encontrar soluções, até inimigos históricos podem assinar compromissos duradouros.

Hoje, para muitos israelitas, a ameaça constante mina a segurança e, para muitos palestinianos, os bloqueios e a ocupação destroem a esperança. A radicalização de discursos e a instrumentalização do conflito agravam a desconfiança, mas as aspirações legítimas não se confundem com as decisões de quem finge liderar e apenas aprofunda as causas do conflito. A enorme maioria, de ambos os lados da fronteira, não participa em atentados nem comete crimes de guerra e não pode ser acusada ou estigmatizada pelas ações de indivíduos, grupos armados ou governos.

A paz exige reconhecer, simultaneamente, o direito de Israel a existir em segurança e o direito da Palestina a constituir um Estado viável e livre. Essa confiança pode nascer da memória do sofrimento próprio, transformada em ponte para reconhecer o sofrimento alheio, se houver lideranças dignas desse nome, vontade política para afastar o peso da desconfiança e se abrir caminho para a esperança, pois sem uma solução viável para o conflito nunca haverá uma verdadeira paz no Médio Oriente e as consequências far-se-ão sentir não apenas nos povos da região mas também no equilíbrio e na segurança do mundo.

Professor Convidado IEP/UCP e NSL/UNL

Diário de Notícias
www.dn.pt