Hoje quem vos escreve é a Rute

Publicado a

Há exatamente um ano escrevi aqui sobre o facto de “menos ser mais”, ou seja, em vez de nos centrarmos tanto no que queremos adicionar e alcançar no novo ano que se avizinha, pensarmos também naquilo que queremos subtrair e eliminar da nossa vida. 

Confesso que fiz esse exercício há um ano e identifiquei tudo aquilo (e todas as pessoas) que não queria na minha vida. E, embora com muito esforço, reconheço, risquei essas coisas e essas pessoas… 

Escrevo hoje de uma forma mais pessoal… intimista até, eventualmente. Quem vos escreve hoje não é a psicóloga, mas a Rute. Apenas a Rute. 

Não sou fã de festas de passagem de ano e já por diversas vezes passei a meia noite do dia 31 de dezembro sozinha em casa, no sofá, em frente à lareira, a ler e a beber um copo de vinho. Alguns anos houve em que estava já a dormir a essa hora e acordei com o barulho do fogo de artifício. Para logo depois voltar a adormecer. 

Para mim, a passagem de ano é apenas mais uma página do calendário que se vira, mas não consigo – talvez como a maioria das pessoas, penso eu – deixar de fazer um balanço do ano que termina e pensar naquilo que desejo para os 12 meses que se seguem. 

Pois bem. O balanço deste ano não é positivo. Foi um ano de mudanças que muito desejava, é certo, mas todas as mudanças, mesmo as mais ansiadas, geram sempre algum stress. Mudei de casa, mudei de cidade, abandonei projetos profissionais que eram já mais frustrantes do que gratificantes e arrisquei tudo. E quando se arrisca tudo também se perde. Perde-se a sensação de controlo e sai-se da zona de conforto. Confrontamo-nos com perdas impensáveis e que muito sofrimento me têm gerado, ao mesmo tempo que – de uma forma totalmente inesperada – pessoas boas e surpreendentes se cruzaram no meu caminho. Reencontrei pessoas que não sentia perto de mim há muitos anos e que me fizeram acreditar que a vida dá mesmo muitas voltas. 

Este ano aprendi que não vale a pena fazer muitos planos. A vida acontece, o amor acontece, o desamor e as perdas também. Continuo a acreditar que é possível fazer o bem e que não fazer nada perante o mal é também uma forma de contribuir para esse mesmo mal. Recordo aqui o D. Quixote e a sua vontade férrea em vencer os inimigos, um cavaleiro andante em defesa do seu amor. Sei que é ficção, mas não será a ficção uma forma inteligente e astuta de abordar a vida real? Embora muitas vezes me sinta impotente face ao mal com que diariamente me confronto, procuro em mim a força deste cavaleiro corajoso, sabendo que tenho ao meu lado tantos Sanchos Pança que mal os consigo enumerar. 

Se o Daniel Oliveira me perguntasse agora “o que dizem os teus olhos?”, a resposta seria imediata: “dizem que estou cansada, muitas vezes triste, mas não desisto de acreditar que melhores dias virão”. 

E é com esta crença – otimista, dirão alguns; irrealista, dirão outros tantos – que desejo terminar este ano e iniciar 2025. Os meus votos são de que todos nós consigamos, de alguma forma, encontrar este caminho de esperança, ainda que confrontados com a adversidade.

Diário de Notícias
www.dn.pt