Há "bazucas" e bazucas
Quando se começou a falar nos fundos europeus para ajudar no combate aos efeitos da pandemia de covid-19, estávamos longe de pensar que outras bazucas se preparavam.
A "bazuca" de que então se falava (e ainda fala), como sabemos, é uma "arma" composta por muitos milhões de euros que tem como objetivo dar resposta imediata aos prejuízos que a pandemia causou nas economias e nas pessoas, mas também criar condições para que se promova o emprego e se apoie o investimento, para que a Europa recupere, mas também que fique mais preparada para resistir a crises, ao mesmo tempo que se tem de tornar mais sustentável e mais digital.
Como bons alunos que somos, Portugal cedo se apressou a apresentar o seu plano, batizado de Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), e que, esperava eu, pudesse ter um raio de ação diferente.
Julgo que é uma evidência que esta bazuca se esqueceu do turismo e que uma das prioridades do PRR devia assentar no apoio às empresas, especialmente ao nível das micro, pequenas e médias empresas, que constituem a esmagadora maioria do nosso tecido empresarial, e que são quem cria riqueza e postos de trabalho. Mas, ao invés, o PRR optou por privilegiar o investimento no próprio Estado e na sua capacidade de prestação de serviço público, sendo que a fatia dedicada às empresas, provavelmente, privilegiará poucas empresas dada a já tradicional complexidade no acesso a fundos, prática comum a este tipo de processos.
Até 2026 temos 16 644 milhões de euros de financiamento para executar, e que deveriam ter como prioridade a capitalização das empresas e o investimento em estratégias de aumento de produtividade e de competitividade do nosso tecido empresarial.
Como se o cenário que temos vindo a viver não fosse já por si difícil, eis que uma verdadeira bazuca toma o protagonismo, com esta guerra lamentável, condenável e imoral, que a todos nós vai afetar, com um impacto muito direto e real nas nossas vidas e, por conseguinte, na nossa economia.
As consequências já começaram: os preços da energia e dos combustíveis a escalarem, as matérias-primas, sobretudo as alimentares, a ficarem cada vez mais caras e os mercados cada vez mais instáveis. A economia mundial, e principalmente a europeia, vai abrandar, e Portugal não vai ficar imune.
Por outro lado, os países europeus vão ser levados a rever em alta os seus orçamentos para a Defesa, e Portugal certamente não será exceção, até por força do seu papel na NATO.
Com tudo isto, os tempos conturbados e de incerteza adensar-se-ão ainda mais. Depois de uma crise sanitária, enfrentamos uma guerra na Europa. Sendo o turismo a indústria da paz, que vive da boa relação entre países, devíamos estar concentrados em criar condições propícias para a sua recuperação, e não em debatermos a dimensão de uma incontornável depressão.
Resta-nos agora esperar para ver o que se vai passar com este conflito Rússia-Ucrânia/resto do mundo, nos tempos mais próximos, com a certeza de que a dimensão da crise agora desencadeada com a guerra irá depender da sua extensão e da sua duração, o que hoje são, para nós, uma completa incógnita.
Para o bem de todos espero que, mais cedo do que tarde, se cale esta deplorável bazuca, e se dê boa execução à outra "bazuca".
Secretária-geral da AHRESP